segunda-feira, 10 de março de 2014

Eu e um "filmezinho" que mexeu comigo...

Eu por vezes dou comigo a pensar que não me conheço ao fim destes anos todos, completamente bem.
Já vivi muito, tive variadíssimas experiências, das quais poucas, muito poucas mesmo me arrependo; não me considero estúpido, tenho mesmo alguma cultura; enfrentei de frente, sem medo a minha sexualidade; sou amigo verdadeiro dos meus amigos e tenho medos, como toda a gente.
Adoro a minha família e tive uma educação primorosa, baseada nos princípios que sempre reinaram em nossa casa; não fui habituado a luxos, mas também me ensinaram sempre a ser digno.
Tudo isto para dizer o quê? Que tenho um temperamento que por vezes não controlo, sou tudo menos perfeito e se procuro consensos, também há alturas em que marco muito, talvez demasiado as minhas paixões e os meus “odiozinhos de estimação”.
Um dos meus maiores defeitos é pôr quase sempre o coração à frente da cabeça, embora não entre em desvarios e nunca me arrependi disso. Quando gosto, gosto mesmo muito, quando não gosto, mostro-o abertamente – nunca seria um bom actor…
Sou muito crítico em relação a certas situações, e não me abstenho de o afirmar, mesmo quando envolvem coisas delicadas, como a política ou a religião.
E…sou um piegas do caraças!!!!
Estou para aqui a palrar sobre mm próprio, quase com medo de afirmar que acabei de ver um filmezinho, nada de um filme de grande orçamento, com grandes actores e vedetas que chamem o grande público. E que quando acabei de ver esse filmezinho tinha duas lágrimas a rolar-me pelas faces – piroso, sou isso talvez, mas que hei de eu fazer se sou assim.
O filme foi realizado por um jovem, Ruben Alves
filho de emigrantes portugueses em França, e com este filme ele quis homenagear os seu pais, a mãe, uma porteira e o pai, trabalhador da construção civil.
Já adivinharam que me refiro ao filme “A Gaiola Dourada”, protagonizado por Rita Blanco e Joaquim de Almeida, e que nos mostra de uma maneira bastante correcta o dia a dia de uma típica família portuguesa emigrada e a trabalhar em Paris. Claro que é uma emigração dos tempos da “mala de cartão” e não a emigração de hoje, mas é sempre emigração, com tudo o que essa situação traz a quem é obrigado a fazê-lo.
Eu, que tantas vezes sou tão crítico do meu país, até da nossa maneira de ser, da nossa tão apregoada falta de produtividade e do nosso hábil “desenrascanço”, vi-me no final do filme, qual sentimentalão romântico a pensar que afinal, caramba, Portugal e principalmente nós os portugueses somos uns gajos porreiros…
Eu sei que isto é apenas um filme, mas está ali muito de nós, muito da forma como somos, quase sempre humildes, o que não quer dizer que sejamos subservientes.
 E por eu ser assim, por reconhecer que eu poderia fazer parte daquela gente é que estou a dizer isto tudo.
Se já viram o filme, gostaria de saber a vossa opinião, mesmo que seja bastante diferente da minha; se não viram, façam o favor de ver, até porque está ali uma das maiores actrizes portuguesas, Rita Blanco
e até o habitual canastrão Joaquim de Almeida se safa muito bem.
Aqui fica um vídeo que mostra algumas cenas do filme assim como algumas entrevistas e também pequenos apontamentos do seu “making of”

24 comentários:

  1. bom dia, João. caramba, grande desabafo :)
    eu vi e gostei, sim, gostei, não obstante os exageros, os quadros sobre a cama do casal, as asneiras a torto e a direito do cunhado, mas ali está o mais importante, os portugueses trabalhadores, o filho que tem vergonha da mãe por ser porteira, a mãe incansável, o pai igual a tantos portugueses que foram trabalhar para a construção civil, e até eu revi a minha mãe e talvez outras mães e pais, simples e desenquadrados naquele hotel de luxo, prenda da filha, que pensava dar uma bela coisa aos pais, e quando recebem a herança, os patrões ricos, os inquilinos do prédio tudo fazem para eles não saírem de lá e continuarem a serem tratados como criados, subservientes, como sempre foram.
    é um bom filme, sim, a RB é uma grande actriz.
    bjs.

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    1. Margarida
      eu não tenho referências pessoais, é certo, mas aquilo que vi, mesmo aquilo a que vocês chamam exageros, eu não os considero como tal, e não podemos esquecer que o realizador sabia muito bem do que estava a falar.
      Fui há 3 ou 4 anos a jantar a um restaurante português em Colónia, daqueles onde quase só vão portugueses emigrados e vi como eles vivem e sentem, em pequenos apontamentos o facto de serem portugueses.
      Uma das coisas mais interessantes do filme, para mim, e a forma como a segunda geração faz a gestão de querer integrar-se totalmente num meio em que vive, mas não deixa de fazer parte de uma família que "não é dali"; não deve ser fácil, e a forma diferente como os dois irmãos encaram essa situação, é curiosa.
      Beijinho.

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  2. Vi o Gaiola Dourada no cinema, vi a realidade da minha avó materna que foi porteira até à reforma nos arredores de Paris, o meu tio na construção civil, outro tio na indústria automóvel, a minha mãe com 16 anos sem falar a língua e emigrou a salto na década de 60 para uma vida melhor, anos mais tarde conhece o meu pai e o resto é história.

    Há quem diga que aquilo foi exagerado e não concordo, é muito genuíno e espelha claramente aquela realidade. Também eu, um grande piegas.

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    1. Eolo
      afirmei isso mesmo no comentário que deixei à Margarida. Aquilo é tudo menos um exagero, parece-me a realidade daqueles tempos; note-se que já não estamos nos anos 60, nos primeiros anos de emigração, mas sim 30 anos ou mais depois, quando as famílias já têm algum conforto e posses, pese embora lhes saia do corpo. E o desejo de voltar e viver a velhice em Portugal é totalmente legítimo, e pouco compreendido pelos seus filhos, como é natural.
      Abraço amigo.

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    1. Edu
      com certeza que irás gostar, pois és um amigo das pessoas portuguesas e da realidade nossa como povo. Mas, será sempre uma visão externa, pois só um português poderá entender toda aquela situação, aquelas vivências, aquela realidade tão nossa de ser português, tanto no melhor como no pior...
      Beijo.

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  4. Também gostei imenso do filme. Acho que retrata uma realidade de forma muito sincera, sem camuflar nem denegrir. É um filme muito inteligente.
    A Rita Blanco está fantástica e como dizes, até o Joaquim de Almeida vai muito bem!

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  5. iLove
    absolutamente, vai aos pontos correctos, é ligeiro, até com cenas de muita comicidade, mas não deixa de focar problemas sérios. O realizador claro que sabe "mexer-se" no assunto...
    Abraço amigo.

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  6. Eu ainda não vi (quero ver!), mas gostei deste post e acho que era um dos que ficava muito bem num livrinho de crónicas pessoais... ;D

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    1. João
      achei um piadão a essa do livrinho de crónicas pessoais, eheheh...
      Tu sabes, estou farto de o dizer que só sei escrever sobre mim ou sobre factos que se passaram comigo,
      vivências e consequências de algum facto lido, visto ou sentido por mim, que tenha "mexido" bastante comigo.
      Na ficção, prefiro a dos outros. A minha vida tem-me dado motivos mais que suficientes para recordar coisas, opinar sobre acontecimentos e até por vezes filosofar sobre outras...
      Abraço amigo.

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  7. João, dois apontamentos. À primeira parte e à segunda. Vamos lá.

    Tu és um homem corajoso. Determinado. Tens uma personalidade vincada e isso é óptimo. É evidente que és culto, educado. Estás de bem contigo e com a tua sexualidade. Vê-se, e eu conheço-te pessoalmente, que és um homem em paz. Eu diria feliz, não sei se erro. O teu temperamento, pois bem, faz parte das personalidades fortes. É isso que te torna o João que nós conhecemos. Às vezes és um bocadinho inflexível, mas, pronto, eu também. :)

    O filme. Não vi, logo, não posso opinar muito. Todavia, a nova emigração não é assim tão melhor do que a antiga de 'mala de cartão'. Hoje, levam um 'canudo', mas as dificuldade mantêm-se. Não será fácil vingar lá fora. Se nos remetermos à Europa, o ultra-nacionalismo de direita cada vez é mais expressivo, odiando-se os estrangeiro e tudo se fazendo para que estes saiam. No Canadá e nos E.U.A, já sabemos: as barreiras são imensas. O Brasil, oh, tem ainda tantos problemas. Angola, ui.

    Portugal tem uma característica única: é um país acolhedor e o povo é hospitaleiro. Não se vê aqui o ódio que se nota aos estrangeiros lá por fora. Eles misturam-se com a sociedade portuguesa. Nem há relatos de ataques xenófobos ou algo do género.

    um abraço.

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    1. Mark, meu bom Amigo
      fizeste-me uma análise que eu não posso desmentir no todo, pois focas aspectos determinantes da minha maneira de ser que revelam que me conheces razoavelmente bem, não tanto pelas conversas que já tivemos (escassas) mas principalmente pelo que ao longo de tanto tempo tenho deixado escrito principalmente sobre mim próprio. Uma referência apenas a que ninguém é totalmente feliz; se por um lado sou imensamente feliz no campo afectivo - amo e sou amado, sem reservas - por outro estou quase sempre separado da pessoa que amo e isto é apenas um exemplo. Como se costuma dizer, a felicidade plena não existe, é apenas a soma de momentos felizes e essa adição é no meu caso bastante gratificante. Outra coisa muito bonita que dizes é que estou em paz comigo próprio e isso é absolutamente verdade até no reconhecimento dos meus defeitos.
      Quanto ao que dizes sobre a emigração, não poderia estar mais de acordo; sobre aquela que o filme refere e a actual.
      A emigração é algo muito difícil e eu já fui confrontado com ela pois quando em 70 fui chamado para a tropa, fiquei indeciso entre ficar e simplesmente aceitar o "destino" de uma guerra para a qual não estava de forma alguma preparado quer nas motivações, quer na maneira de ser, ou emigrar, como tantos fizeram na altura e que não era fugir, ao contrário do que então se apregoava, mas apenas de ser coerente com uma forma de pensar e viver. Só não o fiz, porque no peso dos prós e contras, foi mais forte a certeza de que não poderia estar com a minha família senão daí a muitos anos, e afinal, felizmente, foram quase os mesmos em que estive fora e exposto a perigos vários. Mas emigrar é sempre um acto de coragem, de coragem e de algum desespero e nós somos como disse no texto, um povo "porreiro", pela maneira como enfrentamos as adversidades lá fora e pela forma como acolhemos os que aqui nos procuram.
      Enfim, mais uma vez a blogosfera me permite o que eu realmente gosto: dialogar com as pessoas e dialogar contigo é um prazer acrescido,
      Abraço amigo.

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  8. Como o Mark notou, perspizamente, num comentário anterior, este teu post merece dois comentários distintos.

    Em relação à primeira parte, a tua franqueza (como a que usaste no telefonema que me fizeste hoje), a tua straghtforwardness (desculpa o chavão em inglês, mas é a expressão mais adequada), são uma óbvia qualidade, e são, como é que hei-de dizer, uma espécie de seguro de amizade.

    Quanto ao filme, já o vi há uns tempos (e duas vezes, como te referi), mas há duas coisas que recordo e quero sublinhar. A primeira é que o filme tem um tom de comédia de costumes à francesa (et pour cause...) que caracterizava muito cinema que víamos nos anos 60 e 70 e hoje quase desapareceu, pelo menos dos nossos ecrãs.

    A segunda nota é que se trata de um filme de amor. O realizador brinca e satiriza os tiques de uma certa comunidade lusa em França, mas sempre com bonomia, não a fazer gozo à custa delas, mas a brincar com elas, e isso torna o filme irresistível. Brincarmos connosco, com aquelas características que sabemos que temos e que reconhecemos serem cómicas ou mesmo ridículas, é um saudável exercício, que só quem se tem em conta demasiada é incapaz de fazer.

    Francamente achei uma certa reacção critica desfavorável em relação ao filme muito exagerada. Temos sempre a mania de ser demasiado exigentes em relação aos outros. O filme do Rúben Alves é uma comédia divertida, bem feita, que se deixa ver e apreciar, e que fica connosco depois de o vermos. Faz sentido pedir muito mais a um filme do circuito comercial que é feito para o grande público? Não me parece.

    Eu gosto de ver filmes nas salas de cinema porque filmes como este me fazem lembrar tempos mais antigos em que as pessoas iam muito ao cinema ver precisamente este tipo de filmes. O mundo não mudava, a arte do cinema não evoluía, mas havia um certo bem-estar colectivo, uma boa disposição que se espalhava pela plateia. De certa maneira, é ainda por isso que eu vou ao cinema :)

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  9. Miguel
    é por causa do que aqui dizes, na segunda parte do comentário, acerca do filme, que eu te telefonei.
    Que bom ler o que dizes aqui, é uma crítica e "peras", e concordo inteiramente com o que dizes.
    É muito curioso que todas as pessoas que aqui já comentaram e viram o filme, gostaram dele; eu sei que houve alguma crítica que desvalorizou o filme mas isso também é bem português, típico da alguma pseudo intelectualidade que no cinema endeusa qualquer filme de Manuel de Oliveira, mesmo se o ter visto (não há aqui nenhum preconceito para com os filmes de MO) e um filme "popular" mesmo que seja bem feito, como é o caso, é algo de desinteressante. Enfim, já estamos habituados a atitudes destas...
    Abraço amigo.

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  10. O filme teve nomeação para os 'Césars' , o equivalente francês em muito menor escala aos 'Oscars'. E foi um dos filmes mais vistos em França. Pelos números, não foram só espectadores lusófonos...

    Vi o filme no verão, adoro a língua francesa, e raramente perco filmes falados em francês. A sala estava cheia. Vi muita gente a chorar, famílias inteiras (de avós a netos) de emigrantes. É sim, um filme de amor(es). Justa homemagem.

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  11. G.Souto
    e ganhou o prémio da audiência no palmarés do Cinema Europeu!
    É um filme de uma extrema sensibilidade.
    Beijinho.

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  12. Pronto, convenceste-me! Não vi o filme quando ele andou por aí nas bocas do mundo, por achar que era publicidade a mais e que isso traria "água no bico"! Depois de te ler vou ver o filme, claro, e depois falaremos :-)
    Abraço

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    1. Justine
      gostarei muito de saber a tua opinião...
      Beijinho.

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  13. Vi o Gaiola Dourada no cinema duas vezes, e confesso que foi uma agradável surpresa. Parecia que eu podia também estar dentro daquele filme. Agora a Gaiola Dourada mora cá em casa numa excelente edição de DVD, para saborear quando apetece. Quanto aos teus desabafos, são os teus e também de todos nós. Abraço.

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    1. João
      essa edição de DVD deve ser bem interessante. O filme merece bons extras...
      Quanto aos desabafos, é sempre bom desanuviar, de quando em quando...
      Abraço amigo.

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  14. Piegas! :)

    Vi o filme. A verdade é que isto não é fita nem é exagero o estigma do emigrante em França. Existiu e ainda existe. Para eles somos todos muito trabalhadores, mas não passamos disso. Sabemos mais da história de França do que eles.De Portugal eles apenas conhecem provavelmente "Algarve" convictos que pertence a Espanha....sabemos falar francês ou a desenrrascarmo-nos com a língua deles. O complexo de superioridade leva o ser humano a uma certa ignorância. E o filme mostra também esse lado...

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    1. Mz
      sim, mostra, mas também mostra uma grande diferença na forma, como apesar de tudo nos olham, nesta altura, comparativamente aos anos 60. Agora, nalguns aspectos consideram-nos mesmo, sempre como subalternos, mas como fundamentais e isso também aqui é mostrado.
      Beijinho.

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  15. Gostei bastante deste post. Creio que todos nós, que te acompanhamos à algum tempo, podemos dizer que sim, que te retratamos da mesma forma que tu mesmo te retratas neste belo post. Gostei muito dessa auto análise, da forma como te expressaste. Quanto ao filme, ainda não tive oportunidade de o ver, mas espero ter oportunidade de o ver em breve, tenho ouvido muito boas críticas ao mesmo e um retrato bastante fiel de uma realidade triste, porém verdadeira, da sociedade portuguesa. O flagelo da emigração.

    Abraço amigo :)

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  16. João
    é muito salutar fazermos, de tempos a tempos uma análise à nossa forma de ser e principalmente como vemos a vida.
    Quanto ao filme, se tiveres oportunidade de o ver, não percas; irás gostar, estou certo,
    Abraço amigo.

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Evita ser anónimo, para poderes ser "alguém"!!!