terça-feira, 14 de julho de 2009

Transcrição


Aqui transcrevo na integra o texto que Miguel Vale de Almeida publicou há dois dias no seu blog “Os tempos que correm”, sob o título Talvez não sejamos muitos e muitas…

Porque, nas suas premissas reflecte o pensar de “muitos e muitas”, apesar de eventualmente não concluírem como MVA, porque concordo quase em decalque das premissas anunciadas e porque até sou dos que adiro á sua conclusão, tem todo o cabimento a transcrição desta reflexão no meu blog.

O momento político português é grave e tem que ser equacionado na base do que “não se quer”, e tão mais importante do que ser esta reflexão válida para as próximas eleições legislativas, ela é também extremamente válida para a eleição autárquica em Lisboa, pois mais Santana Lopes, NÃO, por favor!

“TALVEZ NÃO SEJAMOS MUITOS E MUITAS…… mas existimos. Somos as pessoas que, no espectro político-partidário, tal como ele se apresenta (e não o que idealizaríamos), se colocam entre o PS e o Bloco. Não gostamos do PS-centrão, com políticas neo-liberais no trabalho e na economia, e com um séquito de pessoas predispostas ao tráfico de influências. Gostamos do PS quando se apresenta do lado da igualdade, da liberdade, da modernidade. Não gostamos do Bloco quando descai para a demagogia, quando arrebanha as pulsões populistas, ou quando aposta no “correr por fora” desresponsabilizando-se do governo da coisa pública. Gostamos do Bloco quando se apresenta … do lado da igualdade, da liberdade, da modernidade. Alguns e algumas de nós circulam em espaços criados para suprir esse ponto intermédio: em torno de Alegre, em torno de Roseta. Não é o meu caso. Porque acho que sem máquina e sem diversidade de composição social não há transformação política. Mas estejamos lá ou não, estejamos no PS ou não, estejamos no Bloco ou não, partilhamos uma série de preocupações: sentimos que o sistema político português está prisioneiro de uma lógica de grande centro que cedeu demasiado ao neo-liberalismo e que um sintoma disso são as ligações ao poder económico e o tráfico de influências; cortámos há muito com a esquerda revolucionária, mas recusámos a terceira via, acreditando que é possível uma social-democracia que aposte no papel do estado e dos serviços públicos na garantia de igualdade de oportunidades no quadro de uma economia de mercado regulada e com espaço e incentivo para formas de economia solidária e cooperativa; defendemos acima de tudo a liberdade, e esta mede-se na capacidade de garantir opções e escolhas, diversidade, reconhecimento e direitos. Somos pela escolha na interrupção voluntária da gravidez, somos pela diversidade cultural no país e pelo acolhimento dos imigrantes, somos pela plena igualdade no acesso ao casamento civil por parte de casais do mesmo sexo, somos pela despenalização do consumo de drogas, pela laicidade o estado e pela liberdade religiosa, pela efectiva igualdade de género; somos reformistas, no sentido em que queremos transformações concretas na segurança social, na saúde, na justiça, na educação que, com base na valorização dos serviços públicos e na dignificação dos profissionais, melhorem as chances de boa vida para o maior número possível de pessoas, no tempo da sua vida, sem fazer a mudança depender do agudizar de contradições que possam levar, num futuro distante, a uma sociedade perfeita – em que não acreditamos. Não desejamos que as coisas estejam mal para podermos justificar as lutas, desejamos que elas melhorem mesmo e quanto mais cedo melhor; somos pela inovação, pelo conhecimento, pela capacidade inventiva e criadora, pela sustentabilidade energética, pela ecologia – e achamos que estas áreas oferecem o melhor potencial para o futuro económico do país, ao mesmo tempo promovendo o conhecimento, gerador de liberdade; somos por um país que mede o seu valor pelo que faz agora pelos seus cidadãos e pelas suas cidadãs, nascidos ou não aqui, falantes ou não de português, e não pelos mitos do passado, recusando o medo, o atavismo e a violência simbólica das nostalgias do salazarismo ou das utopias revolucionárias. Somos por uma União Europeia assente numa verdadeira representação democrática dos seus cidadãos, com uma verdadeira Constituição e com políticas que ajudem os países mais pobres a aproximarem-se da média comunitária. Somos pela dignificação do sistema político, trazendo para ele novas pessoas, abrindo espaços e diversidades de opiniões, exigindo accountability, e não somos pelo corte definitivo entre a cidadania e a representação ou por alternativas caudilhistas, presidencialistas ou que se deixem seduzir por suspensões da democracia. Em finais de Setembro vamos ter de decidir em quem votamos. Sabemos que não votamos num PSD cuja líder simboliza praticamente tudo o que de negativo foi aqui elencado – uma política que aposta na negatividade e apela aos piores instintos de receio, fechamento, e honrada pobreza. E muitos e muitas de nós estamos tentad@s a votar à esquerda do PS para punir políticas concretas – laborais ou educativas, nomeadamente. Mas mais do que esses argumentos, racionais, espanta-me a onda emotiva que se instalou, para lá das queixas justas, através da repugnância em relação à figura de Sócrates, pintada com as cores da arrogância e do autoritarismo. Ela assenta, a meu ver, num equívoco de percepção: a ideia de que um líder de esquerda deveria ser ou uma figura de bonomia (Alegre?) ou de inflamação revolucionária (Louçã?) – mas nunca uma figura que governa no seu estilo próprio e sem obedecer a um guião estético ou a um folclore de referências específico. Nesse sentido, Sócrates não “bate certo” com o guião cultural português (daí as acusações, como as de autoritarismo e arrogância, que não conseguem, a meu ver, acertar no alvo). Neste momento de crise (que obriga o PS a pensar os erros da deriva neo-liberal da terceira via e do centrão), de desgaste do governo, de acumulação de asneiras por muitos ministros; neste momento de criação de um clima de “derrota” (estabelecida pelos mecanismos retóricos e publicitários de uma comunicação social que em Portugal, ao contrário do resto da Europa, é estruturalmente conservadora); neste momento em que o PS pode (e deve) ver-se obrigado a pensar à esquerda e a pensar em diálogos com muitos cidadãos e cidadãs das várias esquerdas, é o momento de escolher por onde passa a linha divisória entre esquerda e direita. Pessoalmente não acredito que ela passe entre o PS e o Bloco. Acredito que ela passa entre o PSD e o PS. Não quero o regresso do PSD, muito menos do PSD personificado por Manuela Ferreira Leite ou Santana Lopes. Não concordo com várias das políticas deste governo PS que agora termina. Não vi, ainda, o Bloco sair da lógica do “quanto mais dificuldades e tensões sociais melhor”, que o leva a apostar mais no “correr por fora” do que a valorizar as ideias e modos de uma das suas correntes fundadores (a que pertenci), a Política XXI. Mas vejo pela primeira vez, no PS e sobretudo em Sócrates, sinais de um projecto de modernização para o país que se diferencia quer da tentação miserabilista da maior parte da direita, quer da tentação revolucionária da maior parte da esquerda. Justamente num dos piores momentos por que aquele partido passa, e sem qualquer intenção de aderir de novo, enquanto filiado, a um partido, votarei pela primeira vez na vida no PS.”

26 comentários:

  1. obrigado pelos votos de boas férias!
    Abraço grande!!!
    João ;O)

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  2. Está um texto bem "fazido" sim senhor.
    Mas sempre que se fala de política, tudo que se possa dizer, soa-me a mim sempre algo falso e cheio de demagogia. Não sei bem, contudo em termos gerais aprecio e partilho a recomendação.
    Abraço ;)

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  3. Amigo Ruy
    postagens que refiram política ou religião são sempre "perigosas" pois são assuntos que cada um vê à sua maneira e eu respeito muito as opiniões dos outros, mesmo que diferentes da minha. A única coisa que não aceito é a intolerância.
    Mas, ao ver um texto lúcido, de uma pessoa que admiro, pelas suas tomadas de posição, não resisti.
    Abraço amigo.

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  4. Partilho contigo e com o Miguel V. de Almeida a convicção de que a clivagem esquerda direita passa por aí e a ideia de a Manelinha voltar ao poder é demasiado sinistra, mas aquilo que vislumbrei neste PS criou um distanciamento difícil de transpor. Não é que eu espere muito da lisura de meios e sinceridade dos políticos, mas provavelmente, ao fim de tantos anos, eu é que não estava preparada para gente deste calibre.
    Talvez seja porque vivi por dentro e diariamente as mentiras, a má-fé, o cinismo, a maldade de alguns políticos. Que eu sempre supus neutros em relação aos governados.

    Não sei, ainda não decidi o meu voto, mas não me parece que mude de posição até Setembro.

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  5. Mar_maria
    não é meu objectivo tentar influenciar ninguém e este texto que eu aqui transcrevo até é bastante critico em relação ao actual governo.
    Cada um deve pensar pela sua cabeça e apenas pugno pela não vitória de quem já demonstrou, no passado, que não serve a este país...
    Beijinho.

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  6. Um discurso sábio, lúcido e "sem espinhas".
    Concordo por inteiro com o que MVA escreve.
    A não ser que queiramos regredir no tempo...caso contrário será óbvio o caminho certo a seguir lá para Setembro.
    Um abraço.

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  7. Caro Mike
    aliás MVA sabe do que fala, não fala de cor e tem a lucidez de estar dentro de muitas coisas que escapam à maioria de nós...
    Abraço amigo.

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  8. Não sei porquê, centrei-me na primeira frase do texto. Resume (-me) imensa coisa...
    beijo grande

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  9. Sim, Martinha, é um excelente cartão de visita...
    Beijinho.

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  10. ah, o texto é uma declaração de voto. eu também não quero o PSD, mas também não quero este PS que me lixou exemplarmente a vida, que diabolizou professores, que os dividiu e encheu de uma burocracia oca e desmotivadora, que a cada dia que passa mais enterra a educação em proveito dos números. e esse é também o meu mundo. claro que há o outro: o da possibilidade dos casamentos entre homossexuais, por exemplo. sinceramente, não sei se me chega. e mais choques tecnológicos?...


    bem, políticas à parte, um abraço

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  11. Paulo
    obrigado pelo teu comentário que, se existisse já sabia de antemão não teria o teu acordo; a tua classe foi das mais atingidas por este governo e não vou dizer que seja fácil ultrapassar isso; mas é com o seu eleitorado fiel e com o descontentamento de vários sectores profissionais que o PSD conta para (com o apoio do CDS) vir eventualmente ganhar as eleições e fazer ainda pior, pois o "apoio" do PSD à luta dos professores foi pura demagogia...
    O problema está aí; como fazer para o PSD perder as eleições? Se me garantissem que a solução era votar BE (partido que considero válido, como oposição), eu até votaria sem olhar para trás; se me dissessem que seria o voto nulo ou branco que resolveria a questão, idem aspas; até votaria PC se tal inviabilizasse de facto a vitória de MFL.
    Só recuso a abstenção, pois quem se abstém não pode depois reclamar...
    O que resta?

    Como dizes e bem, políticas à parte, abraço amigo.

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  12. Pinguim querido,
    excelente análise, excelente. parabéns pela tua coragem de sempre.

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  13. Olá Popelina
    não é uma questão de coragem; apenas uma concordância com uma excelente leitura da situação política do portugal de hoje.
    Apenas isso.
    Beijinho.

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  14. Adorei o texto e partilho na integra com a opinião do MVA, para mim se o PSD ganhar terá o mesmo impacto que voltarmos a um governo fascista por vontade dos portugueses.
    A Manuela Ferreira Leite enojoa-me, o Santana Lopes é um idiota que não devia ser autorizado a exercer algum cargo politico, e só de pensar numa nova coligação PSD CDS/PP, com o Paulo Portas dos submarinos e das fotocopias de documentos secretos, esse ser especialmente hipócrita que supostamente defende a familia tradicional às custas das outras familias.
    Não, é preciso dizer "não" a este movimento que está a levar Portugal de volta ao abismo e à cauda da europa a nivel de direitos humanos.

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  15. Caro Swear
    já não é novidade para ti a minha opinião; só nunca a soube exprimir tão bem quanto o MVA; daí a transcrição.
    Abraço grande.

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  16. Haha, muito obrigado, vais ver que qualquer dia também passas a viver dia a dia com o Déjan :)

    Eu sinceramente não gosto muito de política, principalmente da portuguesa, desconecta-me completamente... Nem ligo. Mas eu nunca dei muita importância a Portugal, sempre me vi no futuro num outro lugar, e tendo família no estrangeiro até é mais rápido o acesso... Portugal e as suas politiquices passam-me ao lado :P

    PS: o Fred é grego sim, esqueci-me de dizer, e eu sou escocês, é so misturas :)

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  17. Não tenho como falar da política em Portugal, que me é desconhecida. Mas posso explicar o 32-não-33: esse tal Ted no título do post é um britânico que há 11 anos sobreviveu a uma avalanche de neve e agora ganhou uns 8 milhões na loteria lá dele. Aqui no Brasil, a megassena sorteia 32 (e não 33) milhões hoje. Com isso em mente, releia o post. :-)

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  18. Resumir as próximas eleições a uma guerra PSD vs PS é enviesar a questão.
    Não há outras soluções?
    Estaremos condenados a escolher "um mal menor"?
    Eu não quero o PSD por não concordar com as ideias da "senhora", mas também não quero este PS governado por um bando de mentirosos.
    Mas compreendo as opções que cada um irá tomar, por uma ou outra razão. E não me admira nada o conformismo de alguns. Afinal é culpa do fado ou dos "brandos costumes" dos portugueses!!!!

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  19. Xavier
    não vai ser assim tão fácil, pois o Déjan não é assumido no seu país (aliás a Sérvia é terrivelmente homofóbica) e como tem dois anos de estágio a fazer lá (está a terminar Medicina), só depois se poderá pensar numa eventual vinda dele para aqui, onde toda a gente o aceita, desde a minha família a amigos.
    É curiosa a vossa "conjugação" greco-escocesa...mas suponho que estudem no mesmo país...
    Seja como for o que interessa é que são felizes!!!!
    Sobre política portuguesa, confesso estar farto, mas devemos ser nós a dizer quem nos governe e não deixar isso aos outros; daí, este post.
    Abraço amigo.

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  20. Amigo Edu
    imagino que estejas tão "bem informado" da política portuguesa, como eu da brasileira, embora saiba quem é o vosso Presidente e a forma como ganhou o poder; daí a minha admiração por ele.
    E agora já percebo a origem do 32...
    Obrigado pela explicação.
    Abração.

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  21. Amigo Tong
    sei que não pensamos exactamente da mesma forma quanto à política portuguesa da actualidade, mas também não estamos nos antípodas...
    Não é uma questão de enviesar a situação o facto da opção PS ou PSD; mas sinceramente tu vês alguma outra hipótese para a governação portuguesa?
    Daí, o "drama"...

    Abraço sobretudo amigo.

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  22. Passei para deixar poesia...



    Aconchego

    Poesia...
    Tantas vezes...
    Tão pequenina...
    E que tanto...
    Encerra...
    .....
    Hoje...
    ......
    Sem nada escrever...
    Apenas a pensar...
    Sinto que...
    Apenas a poesia...
    É o meu aconchego...
    .............
    Lili Laranjo

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  23. Olá Lili
    obrigado pela visita; é sempre um excelente cartão de visita uma bela poesia.
    Volta sempre que queiras, com ou sem poemas...
    Beijoquita.

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  24. Após ouvir falar do Texto vim ler, mas confesso que fiquei decepcionado.
    Pensei que a reflexão dele fosse noutro sentido...
    Julgo, que após as eleições, podemos cair numa grave crise social se não houver uma convergência pós eleitoral entre a esquerda, em caso de não haver maioria absoluta. Mas daí até achar que o Sócrates é a solução de futuro...

    Após as eleições teremos montes de empresas a despedir, que não o fizeram até aqui devido a várias pressões...

    Esperemos que os Partidos estejam à altura, mas nós cidadãos, temos também que nos mentalizar que o futuro passa por nós, e que nas sociedades sem saída só uma ruptura social pode trazer novos avanços à sociedade.

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  25. Fernando
    eu não chego a esse ponto; mas concordo que terá que haver uma consciencialização muito maior dos três partidos de esquerda, o que não antevejo fácil, é claro.
    Abraço.

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Evita ser anónimo, para poderes ser "alguém"!!!