Em 1997 o filme “Good Will Hunting”, que em português se chamou “O Bom Rebelde” foi candidato a vários Óscares, entre os quais o de melhor filme, melhor realizador (Gus Van Sant), melhor actor (Matt Damon), melhor actor secundário (Robin Williams) e melhor argumento original ( Matt Damon e Ben Affleck). Ganhou dois e muito merecidamente – o de melhor actor secundário (RW) e o do melhor argumento, algo inesperado devido principalmente à pouca experiência e muita juventude de Damon e Affleck (curiosamente ambos actores e protagonistas deste filme, que também os lançou no mundo do cinema, embora Damon tenha hoje uma projecção de grande actor e Affleck, apesar de bonito e atractivo tem-se mostrado um canastrão na arte de representar).
Se há num filme uma cena que justifique, só por si, a justiça dos dois Óscares obtidos é esta, pois nela está todo o portento representativo de Robin Williams, mas também um diálogo, quase monólogo, assombroso, entre o psicólogo Sean e o “bom rebelde” Will.
É uma cena de um segundo encontro entre ambos; Will é um génio matemático e não só, que consegue falar de uma maneira brilhante sobre temas variados que nunca estudou, e Sean, um psicólogo que o tenta ajudar a “encontrar-se”.
Claro que não é a mesma coisa que ouvir a cena falada em inglês, como está no vídeo, mas para quem não domina bem o inglês, dei-me ao trabalho de trazer aqui a tradução portuguesa desta cena:
"É o senhor outra vez?
Vem comigo.
Que é isto agora, um momento|de qualidade entre dois gajos?
Muito bonito... Tem um fraco|por cisnes, algum fetiche?
Que talvez devêssemos|dissecar?
Estive a pensar no que disseste|outro dia sobre o meu quadro.
Passei metade da noite acordado|a pensar.
E ocorreu-me uma coisa...
Depois caí profundamente a dormir|e não voltei mais a pensar em ti.
Sabes o que me ocorreu?
Que não passas de um puto que não|fazia ideia do que estava a dizer.
O que é natural;|nunca saíste de Boston.
Deves ser capaz de me resumir|todos os livros de arte já escritos.
Miguel Ângelo...|Sabes imenso sobre ele.
Obra, ideais políticos,|relações com o Papa,
orientação sexual, tudo?
Mas aposto que não sabes|a que cheira a Capela Sistina.
Nunca lá estiveste a olhar|para cima, para aquele tecto.
Nunca o viste.
Falando de mulheres, descreves-me|uma sebenta inteira de tópicos.
Até podes ter ido para a cama|com algumas.
Mas saberás o que é|acordar feliz ao lado de uma?
És um puto todo teso...
Se te falasse da guerra, eras|capaz de me vir com Shakespeare?
"Uma vez mais a contenda,|queridos amigos..."
Mas nunca estiveste numa.
Nunca tiveste no colo|a cabeça do teu maior amigo
e o viste respirar uma últimavez,|pedindo-te ajuda com o olhar.
Falo-te do amor e certamente|me recitarás um soneto.
Mas nunca olhaste uma mulher|sentindo-te totalmente vulnerável,
nunca conheceste nenhuma que|te consolasse só com o olhar
e te fizesse sentir que Deus|tinha criado um anjo só para ti,
para te arrancar|das profundezas do lnferno.
E não sabes o que é ser|o anjo dela,
sentir um tal amor por ela,|estar-lhe de tal maneira ligado
que a apoiarias|até se tivesse um cancro...
Não sabes o que é dormir sentado|dois meses num quarto de hospital,
por os médicos verem
que a frase "horas de visita"|não se te pode ser aplicada.
Não sabes o que é sofrer|uma perda dessas,
porque só sabe quem ama alguém|mais do que a si próprio.
Duvido que tenhas ousado|amar assim tanto alguém.
Olho para ti e não vejo|um homem inteligente e confiante.
Mas um puto atrevidote|e borrando-se de medo.
Mas um génio, Will,|isso ninguém nega.
Ninguém perceber jamais a complexidade|que há dentro de ti.
Mas lá por teres visto|um quadro meu
julgas conhecer-me e que podes|dissecar a minha vida inteira.
És órfão, não é?
Achas que posso começar a imaginar|o dura que foi a tua vida,
o que sentes, quem tu és,
lá por ter lido "Oliver Twist"?|O livro define-te, achas?
Pessoalmente estou-me a cagar,
por não aprender nada contigo|que não leia num livro qualquer.
A não ser que queiras falar|sobre ti, sobre quem és...
Nesse caso fascinas-me,|nesse caso sou todo teu.
Mas isso não queres tu,|pois não?
Por medo do que poderias dizer.
A decisão é tua, chefe."
terça-feira, 31 de agosto de 2010
"O Bom Rebelde"
Publicada por
João Roque
à(s)
00:14
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Etiquetas:
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Sem dúvida um excelente filme, com grandes actores, bom argumento e tudo mais... não era por nada que estava nomeado.
ResponderEliminarNuno
ResponderEliminarainda me recordo, durante a cerimónia dos Óscares a genuína e sã alegria como Damonn e Affleck receberam e agradeceram o seu troféu.
Abraço amigo.
Interessante, será um filme que vou querer ver!!
ResponderEliminarEstou a adorar os textos!!.
Se tiver oportunidade uma vez que gosta de filmes, este é uma chamada de atenção ao mundo, vi chorei, revoltei-me e dei o meu grito de revolta de chocante que é.
O nome do filme é Flor do Deserto, conta a história verídica de uma modelo que foi mutilada, o resto deixo para que veja.
Abraço grande e muito apertado
Com carinho
Sairaf
Esse filme é de facto muito bom! Já o vi duas vezes, gosto imenso! ;)
ResponderEliminar:)Olá João! Já não vinha cá há uns tempitos, a net é sempre em doses pequenas :)Olha que boa escolha! Sempre adorei este filme. É como dizes, esta cena diz muito do argumento fabuloso, por várias razões. Há várias cenas em que se fala de amor, e nas suas manifestações no quotidiano :) E já agora, também gosto da outra mensagem do filme...para mim, é que nem sempre somos obrigados a ser/fazer aquilo para o qual temos maior aptidão... temos apesar de tudo,a possibilidade de escolha...e eu identifico-me plenamente com essa mensagem :) Um beijinho enorme para ti!
ResponderEliminarGrande, magnífico filme. Curiosamente, revi-o há umas semanas:))
ResponderEliminarAbraços
Despertou-me o apetite.
ResponderEliminarVou vê-lo...
[]
Tenho que ver esse filme, já ouvi falar tão bem dele. Tenho que o procurar na fnac, naquelas promoções pode ser que apareça, bjs
ResponderEliminarRobin Williams é excelente. a cena é memorável! afinal, não é só falar, inventar narrativa, é preciso vivê-la... uma ideia simples, afinal. adorei!
ResponderEliminarabraço
Sairaf
ResponderEliminareu adoro cinema; quando estudei em Lisboa, eu chegava a ver quatro filmes por dia nos chamados cinemas de reprise, que tinham sessões com dois filmes. Via tudo o que havia para ver e desde então, virei cinéfilo, e nessa altura o cinema europeu era muito bom, com Bergman e os italianos (Felinni, Visconti, Antonionni e Pasolini), a Nouvelle Vague francesa (Godard, Malle, Truffaut) e alguns filmes ingleses e até alemães.
Depois, nos últimos anos, embora sempre a par do que se vai fazendo, deixei de ir ao cinema, só indo muito pontualmente.
Apesar de ver um filme num cinema seja o ideal, agora com um bom plasma e uma alta definição vê-se excelente cinema em casa - é isso que tenho feito, estou a rever filmes magníficos e a ver filmes que me tinham escapado; vi nos últimos meses tão bom cinema que quase poderia ter um blog só para cinema, pois por vezes apetece-me mesmo falar em certos filmes.
Este é um desses casos, um filme que há muito desejava ver e que me encantou.
Vou ter em consideração o filme recomendado.
Beijinho.
Félix
ResponderEliminaro cinema americano, apesar do quase monopólio que tem na exibição comercial portuguesa, o que leva a que muita coisa que não vale nada apareça por aí, em detrimento de outros filmes que são postos de lado, o cinema americano, dizia eu, mostra-nos por vezes grandes filmes que nos levam mesmo a ter paixão pelo cinema.
Este filme é um deles e eu valorizo sobremaneira aqui o argumento escrito por dois jovens, um argumento simples, mas muito interessante que só poderia ter sido escrito por gente jovem. Foi talvez o prémio mais merecido das muitas dezenas de prémios que o filme arrecadou.
Abraço grande.
Olá Eva
ResponderEliminarque saudade tuas...
Pois como já disse aí atrás (quando gosto mesmo de uma coisa, falo muito sobre ela), este filme toca-nos muito e mostra nesta cena, não o choque, pois entre estas duas personagens, não há choque algum, pelo contrário, mas sim a visão diferente de uma mesma realidade, seja ela Miguel Ângelo, a guerra, o amor...
Há aqui uma complementaridade entre a teoria e a prática, entre a juventude e a experiência, do que é afinal a Vida.
Eu, que não sou o génio que o Will era, identifico-me totalmente com Sean, mas não só com os seus dizeres, também com a busca de si próprio através da ajuda a outra pessoa.
Magnífico.
Beijinho, minha querida.
Justine
ResponderEliminarse o reviste, decerto o fizeste porque gostaste muito dele.
Acho impossível não se gostar deste filme.
Beijinho.
Caro Francisco
ResponderEliminarimprescindível, vê-lo.
Podes encontrá-lo em doses industriais no Torrents e num quarto de hora tens o filme.
Gostaria depois de ter a tua opinião.
Abraço amigo.
Poetic Girl
ResponderEliminarestou convencido que o encontras facilmente.
Outra sugestão é os Telecines da Zon e da Meo: o filme aparece por lá, e foi aí que eu o vi.
Não percas.
Beijinho.
Paulo
ResponderEliminaré exactamente isso, amigo. Parece o ovo de Colombo...
Mas além desta memorável cena em que Robin Williams mostra o que é ser um grande actor, há toda a abordagem que Sean faz ao caso de Will, sentindo que através dele, oriundo do mesmo meio, poderá resolver algum dos seus problemas do passado.
Muito curiosa a repetição variadas vezes da frase "tu não és culpado", no seu último encontro, até Will perceber o que ele queria dizer com aquilo. Afinal, por vezes, é muito difícil fazer chorar um homem.
Abraço grande.
Olá pinguim, um óptimo filme que já vi há alguns anos e que está na altura de ver de novo. Se esquecermos que o que o psicólogo está a fazer não é eticamente correcto, podemos ver que pelo menos dessa forma ele conseguiu alcançar o jovem e faze-lo ouvir por um momento e sair da sua bolha de egocentrismo.
ResponderEliminarO Matt é melhor actor de longe, mas o Bem é mais giro. Bem me lembro dele com o fatinho de Daredevil e que bem que lhe ficava no filme.
Um abraço.
André
ResponderEliminareu sou um leigo em psicologia e portanto é apenas uma opinião minha baseada no que vejo, mas a actuação do psicólogo não me parece eticamente errada, pois ele apenas pretende "chegar" dentro dos problemas de Will, que é uma pessoa fechada e muito difícil de abordar; ele encontrou o melhor caminho, e se bem penso, o que te leva a pensar como dizes, será o facto de ele, de alguma forma, se ter aproveitado de um paciente para resolver problemas dele; mas se assim é, ele não lesou em nada o paciente e até o ajudou: foi uma ajuda mútua.
Quanto a Matt Demon, claro que é muito melhor actor que o Ben Affleck, embora concorde que este último é um "pedaço de homem"...
Afinal os olhos não pecam, verdade, amigo?
Abraço amigo.
Sim olhar não é pecado eheh e por caso o Matt Damon fisicamente não me diz nada. Temos de ver que de facto isto são coisas de filme e por isso é que acontecem. Mas a relação deles a determinada altura deixou de ser uma relação terapeuta/paciente e os papeis misturaram-se… diria que passaram a ser dois grandes amigos e continuar com o processo como psicólogo nestas situações é um erro tão grande que só correu bem porque é ficção! ;)
ResponderEliminarBoa cena.
ResponderEliminarÉ um grande filme sem dúvida. Já vi um par de vezes e como tenho o DVD, de vez em quando vejo novamente mas apenas algumas cenas isoladas.
ResponderEliminarCenas como esta que mostra bem o grande actor que é R.Willims. Embora não consiga gostar de tudo o que faz no registo cómico, o que é certo é que consegue descolar bem desse registo e dar-nos grandes interpretações, mais sérias, mais sóbrias num registo dramático. E é isso (entre tantas outras coisas) que faz um grande actor. É um pouco como dizia o Zoninho...não é só debitar texto.
Outro exemplo disso é outro grandioso filme: O Clube dos Poetas Mortos.
Há neste filme uma parte que invariavelmente repito com uma grande amiga minha. Como sei que não gosta de café, quando a quero espicaçar pergunto-lhe se quer ir beber café. E logo de seguida, antes que ferva, digo-lhe: "um café ou comer uns caramelos."
Skylar: Maybe we could go out for coffee sometime?
Will: Great, or maybe we could go somewhere and just eat a bunch of caramels.
Skylar: What?
Will: When you think about it, it's just as arbitrary as drinking coffee.
Skylar: Okay, sounds good.
Grande abraço.
André
ResponderEliminarestamos completamente de acordo quanto ao Matt e ao Ben; mas quanto à relação psicólogo/paciente, não.
Eles só ficam amigos depois de terminado o "tratamento" e este só termina quando o psicólogo o força a ele, paciente, numa cena muito boa, a chorar depois de confessar o que lhe aconteceu no passado. Quanto a mim, todas as formas tentadas pelo psicólogo tendiam a ir ao fundo da questão e portanto encaro-as como terapias (continuo a afirmar-te que sou leigo e não quero forçar nada, apenas é uma opinião) - isto dava pano para mangas.
Abração.
Johny
ResponderEliminarque cena e que filme!
Abraço amigo.
Miguel
ResponderEliminarQuanto a Robin Williams, completamente de acordo contigo: é um actor desigual na comédia ou no drama.
Além deste filme e do Clube dos Poetas Mortos, há um outro filme magnífico dele "The King Fisher" em que há uma cena dele deitado, nu, na noite, no Central Park, em NY, fabulosa.
Achei giríssima a transposição para a tua realidade, daquele diálogo do Will com a namorada, acerca do café.
Abraço grande.
belo filme, Pinguim, e uma cena muito poderosa. tenho de o rever um dia destes :)
ResponderEliminarabração
Parece-me ser muito bom! Só que, por enquanto, e infelizmente ainda o desconheço! Mas vou tratar de mudar isso um dia destes, hehe.
ResponderEliminarbeijinho
Miguel
ResponderEliminaré um daqueles filmes, como também acontece nos livros, que apetece rever (reler) uma outra vez.
Abraço amigo.
Sandrinha
ResponderEliminarquase que tenho a certeza que é um filme ideal para ti.
Beijinho.
Um filme lindo sem duvida daqueles que vale a pena ver várias vezes.
ResponderEliminarUm abraço
Bruno
ResponderEliminartotalmente de acordo contigo.
Abraço amigo.