Se há filmes que marcam pela sua sensibilidade, um deles é
sem dúvida a obra prima de Luchino Visconti, “Morte em Veneza” (1971).
Aliás todos os filmes que têm Veneza como cenário são
mágicos, como mágica é aquela cidade do Adriático. Acredito que não haja no
mundo uma cidade tão “cinematográfica”.
Neste filme cuja época nos reporta ao princípio do século
passado, um compositor passa férias no Lido, a praia em frente da cidade, onde
procura refúgio para problemas recentes, profissionais e pessoais, e acaba por
se deixar seduzir por Tadzio, um jovem com uma beleza andrógina, que ali passa
uma temporada com a família.
Entretanto é focada também a epidemia de cólera que assolou
aquela cidade na altura e que as autoridades procuram esconder para não
comprometer a estação turística.
A cena final, da morte do protagonista, só, na praia, e com
Tadzio a brincar por perto, é de uma beleza ao mesmo tempo terrível e tocante,
com Dirk Bogarde a ter uma das suas mais brilhantes interpretações.
De realçar a beleza e o porte senhoril de uma grande dama do
cinema europeu, Silvana Mangano, que tantas vezes trabalhou com Visconti.
E também a presença do jovem actor sueco Bjorn Andrésen, que
protagoniza Tadzio, e que podemos ver aqui num curioso vídeo, em que Visconti o testa
para este papel.
Claro que a base desta postagem é a relação do cinema com a
música e aqui não só por ser um compositor o principal protagonista. E há quem
diga que foi em Gustav Mahler que Thomas
Mann, o autor da obra aqui adaptada, se inspirou para dar vida ao personagem.
E é precisamente deste compositor o principal tema musical
do filme, o célebre Adagietto da sua 5ª.Sinfonia, e que para mim é das mais
belas peças musicais de sempre.
Concordo totalmente: um filme magnífico, com uma música linda, rodado numa cidade mágica!
ResponderEliminarBjs
Teresa
Eliminaré um filme que já vi repetidas vezes e algmas cenas são mesmo visitadas habitualmente, como aquelas partes de um livro que nós lemos vezes sem conta, porque nos dá prazer.
Quanto a este Adagietto, é junto com o "Inverno"(Vivaldi), algumas pequenas sinfonias de Mozart(Elvira Madigan), o "Adaggio" de Albinoni e outras tantas músicas clássicas, aquelas que não me canso de ouvir.
Beijinho.
Eu não sou apreciador da obra de Mahler, e conheço o filme que, no seu conjunto, me agrada, longe de o considerar uma obra máxima, contudo. Já quanto a Thomas Mann, é um dos meus ídolos da literatura alemã, a minha predileta. O seu 'Dr Fausto' é uma das mais importantes obras no conjunto das influências da minha pessoa. Ainda não li o 'Morte em Veneza', que considero (e nem é preciso ser-se adivinho) ser muitíssimo mais rico que o filme. Thomas Mann é um génio da escrita e da análise (social, psíquica), o Fernando Pessoa da literatura germânica.
ResponderEliminarAgora as curiosidades... Existe um documentário, biográfico e reconstrutivo, brilhante, sobre a vida de Thomas Mann, que nos dá conta de um homem, casado e pai de família, que apreciava homens jovens, tendo uma fixação, inclusivé, por Klaus, seu filho. Sabemo-lo através dos seus diários íntimos, abertos 20 anos após a sua morte, onde Thomas registava, com o seu conhecido rigor de organização, todos os acontecimentos, pensamentos e sentimentos em seu torno. Como era profundamente analítico e hiper-auto-consciente, Mann não tinha dificuldade em controlar esse sentimento, dando-lhe liberdade de ser, pela estética (é delicioso adivinhar-lhe algum impulso sexual, porque a existir, realmente, era convertido em puríssima apreciação. De longe o consideraria um 'gay frustrado'. Mais perto o consideraria um bissexual com consciência. Mas quase lhe tenho a certeza de uma heterossexualidade com uma alínea homossexual para jovens (coisa tão normal para quem priva com este círculo de grandes génios). E tenho a certeza que a sua esposa, companheira de há 50 anos, sabê-lo-ia, sem alarido ou preocupação mundanas.)
Outra curiosidade é o jovem ator sueco que, depois deste 'escandaloso' filme, evitou todo e qualquer papel homossexual, e simplesmente desapareceu no meio de filmes de menor importância, sobretudo do seu país, tendo-lhe desagradado muito o universo gay que dele se tentou aproximar pela imagem gerada no filme, que não correspondia à sua sexualidade.
Alex
Eliminarcomo eu gosto da profundidade dos teus comentários...
É isto que me faz um apaixonado pela blogosfera, pois podíamos estar aqui a conversar durante tanto tempo sobre coisas que aqui vais referindo.
Claro que não podemos ter opiniões absolutamente convergentes sobre tudo, mas numa coisa nos entendemos: o prazer que ambos temos em certas coisas a que numa globalidade chamamos Cultura.
Mas passemos aos factos que referes: sou um adepto fervoroso do cinema de Visconti e penso que todos os seus filmes são fabulosos; ele não era capaz de ser só bom...Este filme está pois na linha da sua obra total.
Quanto a Mahler, eu não sou um conhecedor profundo da sua obra para poder ter uma visão global da sua música; apenas acho esta sinfonia muito boa, nomeadamente este andamento. Há variados compositores que prefiro a Mahler.
Também de Thomas Mann sou um desconhecedor, não tendo lido nada dele, e até tenho aqui em casa este "Morte em Veneza", permanentemente adiando a sua leitura, talvez por conhecer a história, o que é um tremendo erro. Sei no entanto algo sobre a sua vida e não foi surpresa o que dizes sobre isso. Penso como tu que era honesto demasiado para camuflar seja o que for e que aceitava conscientemente a sua bissexualidade controlada.
Já quanto ao Bjorn Andrésen, ainda há pouco quando escrevia o texto me questionava o que terá sido feito dele. Mas acho muito curioso o vídeo do casting, até porque não é muito habitual vermos este tipo de vídeos.
Abraço amigo.
Qualquer dia quero fazer o meu próprio filme em Veneza, :D
ResponderEliminarTenho de arranjar tempo para cultivar o meu esquecido lado cinéfilo. Fica em lista despera esta tua sugestão.
Abraço.
Catso
Eliminaracho que qualquer pessoa que visita Veneza está já a fazer o seu filme. Passear à noite naqueles silenciosos becos onde se ouvem os sons dos próprios passos, até isso é sublime.
Se ainda não viste, não percas mesmo.
E para não haver desculpas...http://pinterest.com/pin/217087644510946416/
Abraço amigo.
Tenho filme no disco, mas pelo sim pelo não vou guardar também o linque.
EliminarObrigado.
um filme magnífico, sem dúvida. e como gostei muito mais do filme do que do livro, suponho que o mérito seja todo do mestre Visconti.
ResponderEliminarnão consigo ver os clips aqui neste computador, mas há uma canção fabulosa do Rufus Wainwright chamada Tadzio, que diz lá pelo meio:
"In betweeen tonight and my tomorrows
Tadzio where have you been
In between tonight I know it's Tadzio
Tadzio don't you fight"
miguel
Miguel
Eliminarnão li o livro, mas se isso acontece é quase raro, pois geralmente os filmes ficam a perder em relação ás obras literárias.
Mas Visconti é realmente um mestre e a sua obra máxima é também a adaptação dum livro famoso - "O Leopardo".
Não percas os vídeos, principalmente o do Tadzio, pela sua originalidade.
Vou ver se encontro essa música do Rufus...
Abraço amigo.
Confesso que gosto mais de veneza nas fotos, do que quando lá estive :)
ResponderEliminarFoi uma bela viagem, e quem sabe se não voltarei lá :)
Abraço amigo João
Francisco
EliminarVeneza é uma cidade lindíssima, com alguns "senões"; está atufalhada de turistas, por vezes cheira mal, e à noit, fica quase deserta e pode ser algo triste.
Fora outra questão: quanto a preços, é fogo! Daí muita gente pernoitar do outro lado da longa ponte, em Mestre.
Mas é uma cidade para se ir e voltar...muitas e muitas vezes.
Já lá estive uma meia dúzia de vezes e gostei sempre muito. E tenho um sonho que é passar lá um Carnaval.
Abraço amigo.
Vi-o há uns 20 anos, altura em que também li o livro. É daqueles raros casos em que gostei tanto de um como do outro.
ResponderEliminarAndo há mais de um ano para rever o filme, mas tem-me faltado a coragem, precisamente por causa da sua intensidade.
Abraço
Sad
Eliminartens agora essa hipótese, pois deixei um link no comentário ao Catso, onde o podes encontrar.
Abraço amigo.
Sad
Eliminareu não vi ainda essa versão que pus no Pinterest, apenas a saquei do You Tube, para a ter nessa pasta, até pode não ser muito boa, não sei realmente...
Abraço amigo.
Olá João, não sabia que Thomas Mann era admirador de Mahler e se tinha inspirado nele, mas a escolha musical de Visconti para o filme só o vem confirmar. Eu também sou um grande admirador de Mahler (e a 5ª sinfonia, ouvida ao vivo, é de estremecer!) que tem sido utilizado em muitas bandas sonoras, como "Sete Palmos de Terra", "Antes que Anoiteça", "O concerto" e outros.
ResponderEliminarJoão
Eliminaré impressionante o número de escritores, e já não falo em obras, que tenho vontade de conhecer.
Já estive junto à casa em que Mann nasceu, em Munster e já vi algumas adaptações dele ao cinema e até ao teatro e principalmente este livro despertam-me muita curiosidade. E fico ainda mais curioso por me referirem que é dos raros casos em que o filme não fica atrás do livro.
Quanto a Mahler, pouco mais conheço (que reconheça de imediato) do que esta 5ªSinfonia, mas basta este andamento dela para me fazer fã incondicional.
Abraço amigo.
é um daqueles filmes que quanto mais se vê, mais se ama. a realização é notável, a fotografia irrepreensível e não sei se o Dirk Bogarde não terá aqui o papel da sua vida.
ResponderEliminaré difícil transpor um livro para filme, mas julgo que o mestre conseguiu de uma forma extraordinária (não li o livro, mas agora fiquei com bastante curiosidade).
e mahler, bem, foi a escolha perfeita, o desespero, a obsessão de gustav perante o rapaz inatingível e o terror perante a doença e a perda, a música acompanha o filme num crescendo angustiante.
é, como dizes, a obra-prima do mestre, um filme compulsivo e brilhante.
bjs.
Margarida
ResponderEliminareu acho este filme uma obra-prima, mas considero ainda melhor "O Leopardo", adaptado da obra de Tomasi di Lampedusa, um fresco admirável e um tratado notável de ciência política, que é um filme bem à medida de Visconti.
Aliás Visconti não tem filmes senão bons ou óptimos.
Neste filme de hoje, e como bem dizes a música é fundamental e por isso eu o seleccionei para esta rubrica.
Beijinho.
Já li o livro à anos, e foi sem dúvida um enredo diferente. Ainda não vi o filme...
ResponderEliminarMz
Eliminarnão percas este filme, por favor; é uma obra prima.
Aproveita o link que deixei aí nos comentários atrás.
Beijinho.
João, Morte em Veneza é o meu filme preferido, assim como Luchino Visconti é o meu realizador preferido! Já vi "300" vezes o filme, quase o conheço de cor!
ResponderEliminarObrigada, também pelo Adagietto:))))
Justine
Eliminarnão será o meu filme favorito, nem mesmo Visconti será o meu realizador favorito, mas ambos estão, podes estar segura, dentro da meia dúzia de filmes e realizadores preferidos.
O Adagietto é um caso "à parte" na música da qual eu gosto.
Fico satisfeito por ter "acertado em cheio"...
Beijinho.