Não é de todo meu hábito transcrever textos, a não ser que sejam necessários para desenvolver um tema ou porque assim consigo exprimir conceitos, ideias ou sentimentos que desejo transmitir. Ainda menos é habitual transcrever na íntegra um texto de outro blog, penso mesmo nunca o ter feito até aqui, mas tudo tem uma excepção e ela surge hoje e aqui, com a transcrição integral do último post do amigo “Melões Melodia”, que penso me perdoará a descortesia; mas não consigo reprimir a emoção que me provocou a leitura deste texto, e visto apenas termos 3 ou 4 bloguistas comuns nos nossos links, gostaria que este maravilhoso e comovente texto, tivesse a maia ampla divulgação possível. Apenas não coloquei o vídeo com a cena do filme “Amadeus”, mas reproduzo a fabulosa música de Mozart.
"Porque ainda se morre de amor
Hoje fico em casa. Deveria sair, meter-me na confusão da grande metrópole sob a copiosa chuva, o vento desagradável, o frio, fazer as compras de Natal, enfrentar os grandes armazéns cheios de gente, mas fico em casa.
Hoje estou como o tempo, cinzento, chuvoso, porque não sei lidar com o que não consigo entender.
Ontem vi morrer uma criança. Nunca tinha visto morrer ninguém mas não esperava ver morrer uma criança.
Chamou pela mãe que não estava. Depois chamou por mim que não estava. Mas eu, ao contrário da mãe, estava na mesma cidade e não noutro continente.
Já falara antes aqui do meu menino. O único que não estava terminalmente doente e que ficara sem mãe devido à burocracia estúpida e à lei cega e insensível que pensa defender a civilização ocidental mas a despe da boa moral, da alegria e do amor.
Não foi a doença que matou o meu menino, foram as leis. Desde que a mãe teve de tomar a decisão, fazer a impossível escolha, pior do que a de Sofia e bem mais real, que o menino deixou de comer e quando o fazia, rejeitava, e nesta rejeição não só dizia que não à comida mas também ao tratamento. Com os meses o brilho dos olhos definhava, o olhar tornava-se perdido e ver este olhar numa criança, dói.
Quando me via, sorria e abraçava-me. Pedia-me para não desaparecer como a mãe havia feito.
Ontem quando me ligaram, saí do escritório e fui ao hospital.
Desta vez não me pediram que me desinfectasse ou vestisse a bata azul ou que cobrisse os sapatos. Disseram-me: “Entra, só chama pela mãe e por ti. Achamos que não passa desta noite.”
Sorri-lhe como pude. Sorriu-me e pediu-me um beijo. Estive ali três horas a olhar para o meu menino, o meu preferido, a sorrir-lhe e a passar-lhe a mão pelo cabelo encarapinhado. No silêncio cortado pelo “bip” das máquinas.
Adormeceu mas eu fiquei ali a olhar para ele de coração partido e alma desfeita. Estremeceu, abriu os olhos, olhou para mim e sorriu. Aqueles olhos enormes naquele rosto tão magro.
E num minuto o "bip" tornou-se infinito, entraram as enfermeiras, o médico enquanto eu assistia a tudo como se fosse um filme em câmara lenta e só via aqueles olhos grandes fixados em mim.
A cidade calou-se à minha volta e a paz reinava. Fui até a casa e sentei-me às escuras no silêncio. Ignorei o telefone quando tocou, fugi dos compromissos que tinha, vira morrer uma pessoa, uma criança, o meu menino.
Já tarde, quando as pessoas que haviam saído já dormiam, saí, caminhei lentamente sob a chuva da madrugada que me lavava a alma e acalmava a revolta.
Entrei em casa ensopado, já o céu clareava. Dormi profundamente e quando acordei ainda chovia.
Ainda vejo aqueles olhos grandes e negros fixados em mim.
Para muitos, para as estatísticas, foi mais uma criança que morreu de sida.
Para mim foi uma criança que morreu por amor."
Hoje fico em casa. Deveria sair, meter-me na confusão da grande metrópole sob a copiosa chuva, o vento desagradável, o frio, fazer as compras de Natal, enfrentar os grandes armazéns cheios de gente, mas fico em casa.
Hoje estou como o tempo, cinzento, chuvoso, porque não sei lidar com o que não consigo entender.
Ontem vi morrer uma criança. Nunca tinha visto morrer ninguém mas não esperava ver morrer uma criança.
Chamou pela mãe que não estava. Depois chamou por mim que não estava. Mas eu, ao contrário da mãe, estava na mesma cidade e não noutro continente.
Já falara antes aqui do meu menino. O único que não estava terminalmente doente e que ficara sem mãe devido à burocracia estúpida e à lei cega e insensível que pensa defender a civilização ocidental mas a despe da boa moral, da alegria e do amor.
Não foi a doença que matou o meu menino, foram as leis. Desde que a mãe teve de tomar a decisão, fazer a impossível escolha, pior do que a de Sofia e bem mais real, que o menino deixou de comer e quando o fazia, rejeitava, e nesta rejeição não só dizia que não à comida mas também ao tratamento. Com os meses o brilho dos olhos definhava, o olhar tornava-se perdido e ver este olhar numa criança, dói.
Quando me via, sorria e abraçava-me. Pedia-me para não desaparecer como a mãe havia feito.
Ontem quando me ligaram, saí do escritório e fui ao hospital.
Desta vez não me pediram que me desinfectasse ou vestisse a bata azul ou que cobrisse os sapatos. Disseram-me: “Entra, só chama pela mãe e por ti. Achamos que não passa desta noite.”
Sorri-lhe como pude. Sorriu-me e pediu-me um beijo. Estive ali três horas a olhar para o meu menino, o meu preferido, a sorrir-lhe e a passar-lhe a mão pelo cabelo encarapinhado. No silêncio cortado pelo “bip” das máquinas.
Adormeceu mas eu fiquei ali a olhar para ele de coração partido e alma desfeita. Estremeceu, abriu os olhos, olhou para mim e sorriu. Aqueles olhos enormes naquele rosto tão magro.
E num minuto o "bip" tornou-se infinito, entraram as enfermeiras, o médico enquanto eu assistia a tudo como se fosse um filme em câmara lenta e só via aqueles olhos grandes fixados em mim.
A cidade calou-se à minha volta e a paz reinava. Fui até a casa e sentei-me às escuras no silêncio. Ignorei o telefone quando tocou, fugi dos compromissos que tinha, vira morrer uma pessoa, uma criança, o meu menino.
Já tarde, quando as pessoas que haviam saído já dormiam, saí, caminhei lentamente sob a chuva da madrugada que me lavava a alma e acalmava a revolta.
Entrei em casa ensopado, já o céu clareava. Dormi profundamente e quando acordei ainda chovia.
Ainda vejo aqueles olhos grandes e negros fixados em mim.
Para muitos, para as estatísticas, foi mais uma criança que morreu de sida.
Para mim foi uma criança que morreu por amor."
Pinguim - nao e descortesia nenhuma.
ResponderEliminarSabes, ainda estou na fase de ressaca. Chorao como sou, ainda nao consegui verter uma lagrima, mas nao consigo pensar em mais nada.
Pergunto-me, as vezes, porque continuo esta luta, mas nao seria eu se nao lutasse.
E o meu menino que morreu anonimo porque lhe tiraram o amor faz a ultima caminhada sozinho, como o video que escolhi, para ser atirado para uma vala comum quando, apesar dos seus cinco anos, me deu tanto e me ensinou ainda mais.
So queria conseguir chorar.
Abraco
Músico
ResponderEliminarque bom me teres aliviado a consciência...
Pois eu, meu amigo, não pude conter as lágrimas ao ler esta história e podes estar certo que, embora não possa incorporar os teus sentimentos perante o facto, faço uma ideia do estado em que te sentes e também de como se sentirá aquela "Sofia" nigeriana...
Um abraço muito forte e amigo.
Mais uma injustiça neste mundo, dizem que quando se chora muito chega-se ao ponto das lagrimas secarem, quando é que secam as minhas?...
ResponderEliminarSwear, meu bom amigo
ResponderEliminarcalculo que um texto destes te deixe ainda mais abalado, dado o momento tão difícil porque passas.
Faltam-me as palavras para te exprimir toda a minha solidariedade, embora esteja consciente que ela nada resolve.
Um abraço enorme para vocês.
Queria tanto ter amor...
ResponderEliminarTanto...
Quanto mais morrer de amor!
Quase choro com este teu post.
Obrigado pelas tuas palavras.
Aparece no multiply.
Abraço,
Lost
Não me vou referir ao texto, mas sim à situação que é, ao mesmo tempo, triste e revoltante. Fazer uma criança doente "passar" por isto tudo sem o conforto da mãe, é desumano, maquiavélico e tudo o de mau que possa qualificar. Ainda bem que te tinha a ti, Músico, que por muito que te tenhas empenhado em o acompanhar, não tinhas capacidade para substituir a mãe.
ResponderEliminarPaulo
ResponderEliminaraqui o amor é diferente do que aquele do qual estás carente, e esse embora importante (todo o amor é importante), não mata...
Abraço.
Tong
ResponderEliminartens toda a razão e mais revoltante é, pois passas-se no Reino Unido, um dos países mais avançados do mundo; será?
Abraços para vocês.
Comovente o desabafo. Perante a dor do teu amigo, resta-me o respeito silencioso, e a raiva surda contra este mundo de onde a ética e o humanismo quase desapareceram.
ResponderEliminarAbraço aos dois.
(Pinguim, obrigada pelos votos, um bom Ano para ti e teus, e até para o ano:))
Justine
ResponderEliminara ética, esse valor que estudámos na filosofia, mas mais que tudo, nos foi transmitida por laços familiares, infelizmente quase não tem lugar num mundo em que o ser humano é cada vez mais desprezado, e onde só interessa, por absurdo que pareça o que contribua para o "bem estar" do Homem.
Obrigado pelos teus votos e mais uma vez, que tenhas umas férias de sonho.
Beijinho.
Queria ter coragem de ler todos os comentários que já foram aqui postados mas li apenas os primeiros, e não consegui continuar.
ResponderEliminarnão me consigo pronunciar acerca deste assunto. Há muita coisa com a qual sei lidar. Mas nunca aprendi a lidar com a morte. Fico sempre revoltada e deprimida! Ainda para mais quando é uma criança... Nem sei o que dizer :s.
beijo
Sandrinha
ResponderEliminara morte é algo que com a idade nos vamos habituando a lidar e é importante que o façamos, pois é a única coisa certa que temos nesta vida; o que custa, sim, é lidar com certos tipos de mortes que poderiam ser evitadas se o ser humano fosse realmente humano e não uma mera peça de uma complicada máquina, chamada vida...
Beijinhos.
Xis
ResponderEliminaré bom ler um comentário assim; espalhar amor devia ser obrigatório.
É por coisas destas que é bom ser teu amigo.
Abração***
isto é simplesmente de nos deixar sem palavras... não choro, porque sou daqueles a quem as lágrimas já se secaram... mas por dentro senti um aperto ao ler este relato, como há muito não sentia... vivemos num mundo-cão... poderemos tentar melhorar a nossa vida e a daqueles que nos rodeiam, mas (perdoem-me os optimistas) este mundo não tem nem nunca teve salvação... não fosse eu niilista e ateu, diria que estamos todos condenados ao inferno... e ao inferno nos condenamos diariamente, a nós e aos outros... vou-me remeter ao silêncio, como fez o autor deste magnífico texto... abraço a todos/as.
ResponderEliminarAndré
ResponderEliminarpareces reconhecer como me senti "obrigado" a divulgar este "magnífico texto"; como tu, e embora não seja niilista, nem ateu, acho que o mundo caminha para um inferno, chamado abismo...
Abraço.
ainda bem que divulgaste! até já estou a seguir o outro blog! abraço.
ResponderEliminarAmigo André
ResponderEliminarsó por isso já valeria a pena, pois é um blog com muito interesse e embora não conheça pessoalmente o seu autor, parece-me ser um Homem muito vertical, como eu gosto.
Abraço.
Olá! Boa noite! Visite o meu blog e tem lá um DEsafio para si!!! beijinhos
ResponderEliminarKiduchinha
ResponderEliminarjá respondi, à minha maneira, ao teu amável desafio.
Beijinhos.
obrigado pela partilha. emocionei-me!
ResponderEliminarum grande abraço*
Estou deprimido.
ResponderEliminarDepois do texto, depois dos comentários.
Estou oficialmente deprimido.
Do you believe
ResponderEliminarachei realmente importante a partilha, neste caso; é, para mim uma das coisas pela qual a Blogosfera tem razão de existir.
E quem não se emociona?
Abraço igualmente grande.
Arséne
ResponderEliminarficar deprimido é pouco, mesmo oficialmente, fica-se é revoltado!!!
Abração.
Realmente belo.
ResponderEliminarParabéns ao autor e a vc, que compartilhou.
Bjos
Confissões
ResponderEliminarbelo o texto, mas muito triste o conteúdo.
Beijos.
há situações e momentos em que o mundo se torna um lugar insuportável.
ResponderEliminare que nos fazem ficar gratos por termos tido a sorte ou a benção de ter nascido no lado bom da vida.
abraço
Miguel
ResponderEliminaré totalmente verdade e contrabalança os nossos "maus" momentos...
Abraço.
e esta história fez-me arrepiar. Também se morre por estupidez.
ResponderEliminarSem palavras.... só o sentimento de vazio... porque existem coisas que acontecem e nós só podemos assistir ao seu desenrolar... nunca pôr um ponto final ou uma pausa... Porque existem coisas que nos deixam com lágrimas nos olhos e com o coração bem apertado!
ResponderEliminarBeijo grande!!
Violeta
ResponderEliminartocaste-me num ponto nevrálgico, sabias? Se me perguntarem qual o defeito que mais abomino no ser humano respondo sem hesitar que é a estupidez!!!
Beijinhos.
Martinha
ResponderEliminarnó não podemos, mas alguém poderia!
Aí reside a estupidez humana que a Violeta bem referiu...
Beijinhos.
Este mundo é assim!
ResponderEliminarPor isso não me venham falar em "espirito de natal"...
Abraço!
Caro Sócrates
ResponderEliminareste é o ADMIRÁVEL MUNDO NOVO!!!!
Ora Porra!
Abração, meu amigo.
Uma historia de vida triste, por isso deverás comovente...
ResponderEliminarVivemos numa sociedade hipocrática...
Amigo Lampejo
ResponderEliminare quantas mais histórias tristes não haverá por esse mundo fora; hipócrita é um bom adjectivo que encontraste para defenir este nosso mundo...
Abração.
E olha, chorei. Não sou de grandes lágrimas, mas isto...
ResponderEliminarMeu rico menino...
Mar_maria
ResponderEliminarMas isto é a realidade dos nossos dias, minha Amiga.
Beijinhos.
estou com lágrimas nos olhos...sinceramente, e lá está cada vez mais sinto a frieza das leis. na visão do Direito e da Lei, o homem, mulher, criança, não sofre, não se magoa...sofre danos. É triste e fria a lei dos Homens...
ResponderEliminarmas quanto ao senhor que esteve ali ao lado da criança, do seu menino, fez o que de melhor podia fazer, e fez bem...amou alguém que precisava muito ser amado. Fez tudo o que conseguiu.
Não tenho palavras...não dá.Tristeza, somente.
Ima
ResponderEliminar"É triste e fria a lei dos Homens...", e pronto, disseste tudo muma só frase.
Abraço grande.