domingo, 15 de abril de 2012

Antonin Ivanovich Soungouroff

Antonin Ivanovich Soungouroff, nasceu na Rússia em 1894; em 1926 emigrou para a China, trabalhando como ilustrador para a revista russa “Youth”, e os seus quadros eram essencialmente baseados na cultura popular chinesa. Em 1933 estabeleceu-se em França, onde se tornou conhecido pelos seus retratos de atractivos jovens, particularmente jovens pescadores da costa mediterrânica, legionários, marinheiros e soldados. A sua obra está desde então abertamente ligada à vida e cultura gay. Tornou-se amigo de grandes vultos desse tipo de cultura, como Jean Cocteau e Roger Peyrefitte. Faleceu em 1982(?), na Cote d’Azur, no Sul de França.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

3 "Drei"

É este o filme que ontem estreou em Lisboa (Amoreiras) e Porto (Dolce Vita), do realizador alemão Tom Tykwer, que entre outros já nos deu o conhecido "Corre, Lola, Corre", e que agora disseca a vida de um casal da classe média, alemão, ambos à volta dos 40 e do aparecimento nas suas vidas de uma terceira pessoa. É um filme imperdível e dos poucos filmes sobre estes temas que aparecem no circuito comercial.
É curioso ver como este filme mostra na perfeição o conceito de bissexualidade que há dias aqui trouxe.
É um filme com cenas magníficas e aconselho-o sem reservas, e porque corre o risco de passar desapercebido na voragem da exibição de filmes americanos, é para ver rapidamente...
Gostaria muito de ter aqui as vossas opiniões.
Deixo o trailer internacional.


Só uma referência pessoal a uma cena do filme, que é a primeira passada na piscina (uma piscina linda, linda, não é Miguel?). Uma cena que mostra a minha teoria de que tudo é possível se surge uma oportunidade, e estou a falar de novo na bissexualidade.
A música do dia é uma das que faz parte da banda sonora.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Cet amour

Jacques Prévert foi um poeta francês da primeira metade do século XX, que deixou o seu nome ligado ao movimento surrealista. Dento da sua obra, merece destaque o livro "Paroles", de 1946, um dos livros que mais marcou a minha juventude.
Foi também o argumentista de muitos grandes filmes franceses dos anos 30 e 40.
Desse livro "Paroles", retirei este poema, "Cet amour", talvez um dos mais belos que já se escreveram sobre o amor e que aqui deixo na voz inconfundível da fabulosa Jeanne Moreau *


Este amor
Este amor
Tão violento
Frágil
Tão terno
Tão desesperado
Este amor
Tão bonito como o dia
E mau como o tempo
Quando o tempo está ruim
Este amor tão verdadeiro
Este amor tão bonito
Tão feliz
Tão alegre
Tão irônico
Tremendo de medo como uma criança no escuro
Tão confiante
Como um homem tranquilo no meio da noite
Este amor que assusta os outros
Que os faz falar
Que os faz empalidecer
Este amor de espionagem
Porque nós o espiávamos
Perseguidos feridos mortos pisoteados esquecidos negados
Por que temos perseguido ferido matado pisoteado esquecido negado
Este amor um pedaço
No entanto, tão vivo
E tudo ensolarado
E seu
E meu
Ele era o que era
Esta coisa sempre nova
Que nunca mudou
Verdadeiro como uma planta
Esvoaçante como um pássaro
Quente e vivo como o verão
Podemos tanto
Ir e voltar
Esquecermos
E depois dormir de novo
Despertar sofrer envelhecer
Adormecer novamente
Sonhar a morte
Acordar sorrindo e rindo
E rejuvenescer
O nosso amor está lá
Teimoso como um burro
Vivo como o desejo
Cruel como a memória
Seco como o arrependimento
Terno como a memória
Frio como o mármore
Tão bonito como o dia
Frágil como uma criança
que nos olha sorrindo
E nos fala sem dizer nada
E eu tremendo o escuto
E grito
Grito por você
Grito por mim
Eu imploro
Por você, por mim, por todos aqueles que amam
E que são amados
Sim, eu vou gritar
Por você, por mim e por todos os outros
que não conheço
Parado
Onde você está
Onde você esteve em outros momentos
Parado
Não se mova
Não se vá
Nós, que fomos amados
Nós, que fomos esquecidos
Não nos esqueçamos
Não tivemos mais que amor sobre a terra
Não deixemos tornar-nos frios
Embora muito longe ainda
E não importa onde
Dê-me um sinal de vida
Muito mais tarde à margem de uma floresta
Na floresta da memória
Levantemo-nos Agora
Para dar-nos as mãos
E nos salvar. **

É também de Jacques Prévert, outro magnífico poema,"Les Feilles Mortes", que deu origem a variadas versões musicais, de entre as quais gosto particularmente desta de Yves Montand


* Este poema pode ser traduzido em todas as línguas, mas ele é inigualável na sua língua original - o francês!
** I miss you so, so much, Déjan!!!

terça-feira, 10 de abril de 2012

Aquele Abraço

No seguimento do êxito que teve o primeiro concurso PIXEL, da autoria do blog do Sad eyes, ele inicia agora um segundo concurso, cujo tema é a música que estão a ouvir: "Aquele Abraço".
Como gosto deste tipo de concursos, concorri ao primeiro e agora também estou presente nesta segunda edição.
Eis a minha história, que será a História #01 deste concurso.

“Tinha sido há nove meses - o tempo de uma gestação - que o tinha conhecido através de um site de encontros onde ambos tínhamos um perfil.
De uma simples troca de mensagens, passámos num curto espaço de tempo a uma demorada e cada vez mais sedutora troca de mails onde nos íamos dando a conhecer e onde aprendemos a gostar um do outro. O MSN completou este percurso de conhecimento mútuo e então reparei que aliada à beleza interior que já me tinha sido dada a conhecer, havia a beleza externa e ele era o que eu sempre tinha idealizado fisicamente.
Mas estávamos longe um do outro, muito longe, e o passo seguinte, que seria o conhecimento real, não era exactamente o mesmo de marcar um encontro para tomar um café, nem mesmo uma deslocação a outra zona do país. Obrigava a ir a um país desconhecido, a ter com ele. E se as coisas não corressem bem? Se o retrato que ambos tínhamos feito um do outro falhasse por qualquer motivo, sexo incluído? Valeria a pena?
Arrisquei e fui. O encontro no aeroporto foi quase comovente e as palavras faltaram-nos. No táxi que nos transportou ao centro da cidade, ao seu apartamento, apenas tínhamos os nossos dedos mindinhos unidos e trocávamos sorrisos nervosos, mas estávamos a viver um momento único.
Chegados a sua casa, e mal a porta se fechou, abraçámo-nos no mais longo e no mais terno abraço de toda a minha vida. O nosso primeiro abraço, ao fim do qual não havia mais dúvidas e todos os temores e nervosismos se diluíram num primeiro beijo.
O primeiro de muitos, o primeiro de uma nova vida que hoje continua…”

domingo, 8 de abril de 2012

É "in" ser bi???

Desde que há já bastante tempo, mais propriamente desde que li um interessante livro sobre a bissexualidade, da autoria de Margaret Meade, em que ela afirma que todo o ser humano é potencialmente bissexual e essa bissexualidade a maior parte das vezes apenas não se manifesta quer por medo, quer por falta de oportunidade, que estou convencido dessa verdade que aliás vem de encontro ás teorias de Kinsey, segundo as quais as fronteiras entre as diferentes orientações sexuais são ténues nos seus limites e a respectiva catalogação obedece apenas a uma questão de predominância.
Sucede que agora, achei o momento oportuno para falar disto e encontrei um interessante artigo publicado na revista "Única" do jornal Expresso de 29 de Janeiro de 2011, de onde retirei este excerto, já que o artigo é demasiado longo:

"Podemos interrogar se a bissexualidade está na moda como tendência entre a população mais jovem, por exemplo, que, livre de preconceitos, é seduzida pela ideia da experiência? "Penso que não", diz Pedro Frazão*. "O que acontece é que, em Portugal, a discussão sobre as questões de género têm vindo a conquistar cada vez mais espaço na discussão política. Neste sentido, todas as questões relacionadas com a orientação sexual ganharam visibilidade, o que permite às pessoas sentirem-se mais livres para assumirem as suas escolhas. Não é uma questão de moda."
"A androgenia é uma tendência. A bissexualidade está na moda e vende", diz Alexandra Santos, 24 anos, voluntária na rede ex aequo, a associação de jovens lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros (LGBT). Ela trabalha no Projeto Educação da rede e percorre as escolas do país a debater identidade de género: "A orientação sexual é um tema que se discute muito durante a adolescência, e a bissexualidade tem o apelo de ser interessante: sugere mente aberta, capacidade de experimentar... Mas, para além deste aspeto mais superficial, muita gente tem dúvidas sobre a sua identidade, e a bissexualidade é a caixinha da confusão. Mas não basta ter uma experiência homossexual para se ser 'bi'."
Apesar da tendência e da confusão, Alexandra Santos, assistente social, sabe o que sente. Afirma sem vacilar: "Não traio, não sou promíscua, tenho relações duradouras. Gosto de homens e de mulheres em igual percentagem." Soube que a atraíam ambos os sexos quando entrou na Faculdade e começou a perceber "que aqueles sentimentos giros que sentia pelas minhas amigas não eram só amizade". Aí, sim, a confusão instalou-se. Nada tinha ainda acontecido e já ela desesperava. "Ai, ai, o que vai ser da minha vida? Porque todos desejamos a normalidade. Assusta muito perceber que nem sempre é assim", conta Alexandra, agora descontraidamente sentada num café do Chiado. "Depois de me questionar se não seria só uma fase, fiz uma viagem à Bélgica para participar num programa entre jovens europeus, conheci uma rapariga e percebemos que tínhamos muita coisa em comum. Principalmente a nossa fé. Quando voltei, continuámos a falar no Messenger e combinámos encontrarmo-nos. Namorámos alguns meses entre cá e lá e depois terminou."
Foi nessa altura que se aproximou da rede ex aequo. Queria encontrar outras pessoas que sentissem coisas semelhantes e perceber que identidade era aquela. A questão do pecado preocupava-a. Um dia ouviu esta frase de uma crente: "Deus manifesta-se em cada um de nós quando estamos bem e fazemos bem aos outros." Sentiu que poderia ter essa força e arriscou clarificar. Em casa, começou a espalhar discretamente as revistas distribuídas pela rede LGBT até a mãe perguntar: "Aquelas revistas que trazes cá para casa são o quê?" Alexandra falou na ex aequo e explicou o projeto: "E o teu pai sabe disso?" Nessa noite, ao jantar, com as três irmãs e o pai já sentados à mesa, a mãe voltou à carga: "Tu és alguma dessas coisas?" Ela disse: "Tanto poderia casar com um homem como com uma mulher." A mãe ainda tentou dar um ar de normalidade: "Se fosses homossexual, eu aceitava." O pai disse logo que não aceitava e uma das irmãs perguntou-lhe: "O que é que te deu para dizeres uma coisa dessas aos pais?" Alexandra encolheu os ombros: "Porque é verdade."
Hoje acredita que para a sua família seria menos complicado se ela fosse homossexual. Pelo menos, seria uma coisa só. Agora aquilo assim... "Como é que se consegue gostar de homens e de mulheres ao mesmo tempo? Lá está, a questão da promiscuidade. Mas eu sou monogâmica e não tenho namorados e namoradas em simultâneo." Tenta explicar que cada sexo tem as suas diferenças, e ela gosta dessas diferenças. "Sinto-me atraída por pessoas e não por géneros", diz Alexandra. Depois dá conta da frase e desata a rir: "Este é o verdadeiro cliché dos 'cotonetes', não é?"
Pedro Frazão, o psicólogo, esclarece: "Esse é precisamente o discurso da bissexualidade. Interessa é o que se sente por determinada pessoa, independentemente do sexo. Como há uma maior abertura em relação à homossexualidade, essa abertura reflete-se, naturalmente, nos jovens, e observo que cada vez os discursos são menos estanques em relação aos rótulos identitários. Nestas faixas etárias tem-se, naturalmente, menor dificuldade em definir atrações e experiências e há uma noção cada vez mais clara de que todos os percursos são diferentes."
Os pomossexuais. "Já ouviu falar em pomossexualidade?", pergunta Ruben. Espreitamos a Wikipédia: "Pomossexual é um neologismo que descreve pessoas que evitam rótulos restritos como hetero, homo ou bissexual."
Ruben Santos, Raquel Bravo, Marta Cardoso: 19, 17 e 20 anos, respetivamente. São estudantes associativos e muito empenhados em causas cívicas. Ruben e Marta conheceram-se na Associação do Liceu Padre António Vieira. Raquel é animadora de teatro comunitário e amiga de Marta. Os três afirmam perentoriamente que não gostam de definições: "Os rótulos são muito limitadores. Acredito que, ao longo da vida, qualquer pessoa pode sentir emoções pelo sexo de que é suposto gostar e pelo que é suposto não gostar. Não conheço ninguém da minha idade que não sinta essa atração", conta Marta, referindo o seu interesse por raparigas e a maneira como gosta de viver cada uma das suas relações. Por agora está menos interessada no género masculino. Mas, aos 18 anos, ainda nada precisa de ser definitivo.
Também Raquel Bravo tem dificuldade em usar claramente uma palavra que a classifique: "Sei o que não sou", diz, tentando clarificar. "Não sou hetero, nem homo. Durante cinco anos tive um namoro fortíssimo com um rapaz que morreu e depois a minha relação com os homens mudou. Era como se estivesse a traí-lo. Quando entrei no meio artístico, tive as minhas primeiras relações lésbicas", conta Raquel descontraidamente: "Não quero casos. Quero definitivamente estar com alguém que seja minha e eu dela. Não sei se será um homem ou uma mulher, também não me preocupa. Gostar é simplesmente gostar."
Ruben Santos, o rapaz que também não sabe se é ou não homossexual, tem a teoria de que todas as pessoas, se pudessem, seriam 'bi' e acredita que só não são por uma questão de educação. "Como é que uma pessoa pode dizer sim ou sopas se não experimentou?", interroga. "Se temos várias opções, porquê aceitar uma só?" Excluir, logo à partida, a possibilidade de atração por pessoas do mesmo sexo pode ser uma construção. "Para um rapaz, custa muito aceitar. Cheguei a ter nojo de mim. Fazia-me confusão a ideia de uma relação estável ou de envelhecer ao lado de um homem. Agora, embora ainda sinta algum medo desse quotidiano, já não penso tanto nisso."
Marta, que em breve irá para a universidade e tem ideias muito próprias sobre o amor, conta que nunca se sentiu excluída ou posta de lado quando está com uma rapariga. Os amigos todos sabem e aceitam. Afirma que na sua geração é normal nos liceus os casais homo andarem abraçados: "Ninguém liga. Nem os professores."
Ruben, apesar das dúvidas, por agora não lhe interessa pensar em escolhas. Neste momento, namora com um rapaz. Mas sabe que quer ter filhos seus. E não é só isso: "Gosto do masculino e do feminino. De proteger e de me sentir protegido quando me deito num abraço", reflete.
"A bissexualidade é a zona invisível", diz Joana, a terapeuta. "A ânsia de sabermos o que somos, de nos definirmos, tem a ver com a eterna necessidade de tentarmos perceber porque nos apaixonamos por A ou por B. Nunca sabemos porque nos apaixonamos, e mesmo para a ciência continua a ser um grande mistério.”

* - Pedro Frazão, psicólogo clínico, especializado em questões de género, concorda que, entre todas as orientações sexuais, a bissexualidade é a mais difícil de definir. "Na comunidade académica e científica era entendida como uma imaturidade. A partir do Relatório Kinsey publicados entre 1948 e 1953, a nossa sexualidade começou a ser observada como um mapa que se vai construindo e delineando ao logo da vida, sobretudo no percurso das mulheres", afirma o psicólogo. "É um dado que a sexualidade feminina é mais complexa, e nas mulheres a orientação sexual decorre com maior fluidez do que nos homens."

E não me perguntem bem porquê, mas achei nada descabida, e até bastante oportuna a inclusão nesta postagem do conhecido vídeo dos R.E.M. "Everybody Hurts"

segunda-feira, 2 de abril de 2012

"António & Miguel"

Tenho plena consciência que esta postagem vai agradar apenas a uma restrita franja de quem me segue.
Há muito, tenho em "stand by" estes dois vídeos, que no seu conjunto, mostram um bailado apresentado em 2000 em publico, com coreografia de Miguel Pereira e interpretação do próprio e de António Tagliarini e tenho hesitado em publicá-lo aqui ou não; a hesitação não é motivada, pelo facto da nudez dos corpos, pois é uma obra que nada tem de pornográfica ou mesmo de provocadora.
A hesitação deve-se ao restrito número de apreciadores deste tipo de bailado, integrado no bailado contemporâneo, por vezes de muito difícil assimilação.
Miguel Pereira é um bailarino e coreógrafo com provas dadas no mundo do bailado e ousou ser ele próprio nesta que talvez seja a sua peça mais representativa. 
Esta peça é uma reflexão sobre o espectáculo, sobre a criação e sobre o intérprete enquanto intermediário da obra. É um trabalho de evocação a outros criadores que influenciaram o nascimento desta peça e que questionam a pertinência do próprio espectáculo. Uma grande ambiguidade entre o verdadeiro e falso está profundamente inscrita em "António & Miguel".
Se bem que o espectáculo seja apresentado como "de dança", e seja da dança que vêm ambos estes criadores, trata-se essencialmente de uma performance.
Apesar destes considerandos, é uma peça fundamental da história da dança contemporânea em Portugal.

O segundo vídeo é bastante mais interessante que o primeiro ( para os que acharem que "isto" é chato).



sábado, 31 de março de 2012

Ilha de Metarica

Como muita gente estará recordada foi publicado neste blog uma saga sobre o que foi a minha vida militar, desde Mafra até à passagem à disponibilidade.
Claro que a quase total incidência dessas crónicas se refere ao período em que estive na guerra colonial, primeiro na Guiné (4 meses), a estagiar para o curso de capitães milicianos e principalmente em Moçambique, para onde fui destacado em rendição individual a comandar uma companhia da guarnição local (isto é, quase na totalidade constituída por pessoal natural de Moçambique), localizada no Niassa, mais concretamente num local chamado “Ilha de Metarica”, que embora não fosse uma ilha, quase se poderia considerar como tal, já que em 100 kms ao seu rodar, não vivia permanentemente ninguém.
As instalações como na altura mostrei por fotos eram incríveis, sem o mínimo de condições, e foi ali que passei cerca de 20 meses da minha vida.
Sucede que recebi há dias um mail de um indivíduo que tinha estado nesse mesmo local, cerca de dois anos antes de mim, e que terá pertencido à primeira companhia ali estacionada, pelo que foram eles que tiveram que pôr de pé aquelas instalações perfeitamente básicas. Enviou-me algumas fotos desse tempo que eu apreciei bastante, pois deu para comparar com o que havia no meu tempo, apesar de tudo, bastante melhorado; e também durante o meu comando se continuaram a fazer melhoramentos, pois além de nos trazer algum , pouco, mais conforto, ocupava o tempo do pessoal, no intervalo das operações.
Reparem para começar na diferença da vista aérea, sendo a primeira foto a da formação do aquartelamento, e a segunda, a do meu tempo




Aquele mastro que se vê no centro da segunda foto, visto ao perto era assim

Nas fotos que me foram enviadas, pode ver-se o início da construção da "messe" de oficiais e sargentos

e nesta outra o aspecto que a mesma tinha no meu tempo

Outra foto antiga mostra toda a precariedade da secretaria, onde funcionava toda a parte administrativa e onde eu tinha a minha secretária

Embora não tenha nenhuma foto digitalizada deste "edifício" no meu tempo, já sem aqueles bocados de cartão,  posso mostrar uma do seu interior, em que se vê a minha secretária


As restantes fotos que me foram enviadas não têm grande alteração entre o tempo mediado; uma refere-se aos "chuveiros"

e esta outra, ao "bar" dos furriéis

E assim se vivia(?) durante a guerra colonial, quando não se andava no mato ou na picada.

Para complemento, e para quem não saiba, havia uma extensa compilação de canções, baseadas em músicas conhecidas, com letras absolutamente proibidas, mas que se ouviam cantar em todos os aquartelamentos e até em locais mais frequentados por oficiais e sargentos, desde que não fossem ouvidas pelos "chefões". Chamava-se o Cancioneiro do Niassa, e ainda devo ter por aqui em casa um exemplar dele.
Deixo um vídeo, com uma dessas músicas do Cancioneiro.

quinta-feira, 29 de março de 2012

"You're my thrill"

Essa fabulosa cantora que se chamou Billie Holiday, cantou esta maravilhosa canção, cuja letra segue em baixo do vídeo
"You're my thrill
You do something to me
You send chills right through me
When I look at you
'Cause you're my thrill
You're my thrill
How my pulse increases
I just go to pieces
When I look at you
'Cause you're my thrill
Hmmm-nothing seems to matter
Hmmm-here's my heart on a silver platter
Where's my will
Why this strange desire
That keeps morning higher
When I look at you
I cann't keep still
You're my thrill"
Depois de ouvir a canção, conhecer a letra da mesma, já posso aqui pôr a curta que era e é o objectivo desta postagem. É que assim se percebe melhor o filme, que é muito belo.
Aproveito para dedicar este post ao Déjan e ele sabe porquê...

terça-feira, 27 de março de 2012

As Três Graças*

* Este é possivelmente o mais longo post deste blog, mas não é cansativo.

Graças, nome latino das Cárites gregas, eram as deusas da fertilidade, do encantamento, da beleza e da amizade. Aglaia, a claridade; Tália, a musa da comédia e da poesia; e Eufrosina, a deusa da alegria.
Nas primeiras representações plásticas, as Graças apareciam vestidas; mais tarde, contudo, foram representadas como jovens nuas, de mãos dadas; duas das Graças olham numa direção e a terceira na direcção oposta.
Esse modelo, do qual se conserva um grupo escultórico da época helenística, foi o que se transferiu ao Renascimento e originou quadros célebres como "A primavera", de Botticelli, e "As três Graças", de Rubens.
Sandro Boticelli -A Primavera

Rubens

Mas comecemos pelo princípio, pelas representações do período helenístico




As Três Graças de Pompeia

Depois temos diversas telas da Idade Moderna
Raffaello

Jean-Étienne Liotard

Cranach

Grien
Hans Aushen

Duas esculturas
Bertel Thorvaldsen

Canova

Uma outra escultura portuguesa, que está na Praça de Londres
Fernando Fernandes

Alguma arte contemporânea
Delaunay

Randolphlee-mciver

Lucy Unwin

Marisol Diaz

Algumas "variações"
Leonard Nimoy

Harald Seiwert

Joel-Peter Witkin

Alexandre Mury

Tom of Finland

(autor desconhecido...)

Século XXI
Kehinde Wiley

Promoção da Samsung

A caricatura



E finalmente, a triste realidade

domingo, 25 de março de 2012

"O Rapaz da Última Fila"

É curioso. Vejo muitos filmes, mas não no cinema, em casa; a excepção é em Setembro quando aparece o Queer Lisboa, e aí é "por atacado".
Mas, em proporção vou mais ao teatro, porque gosto muito de ver teatro. Há uma comunhão entre os actores e o espectador que é maravilhosa.
Não vejo tantas peças como quereria, mais por inércia, mas apesar de tudo, nos últimos três meses vi três peças: "Design for Lovers", na Comuna, "Quem tem medo de Virginia Wolf", no D.Maria, e "As Bacantes", no S.Luiz.
E ontem voltei a ver outra; há muito que não via uma peça dos "Artistas Unidos", a companhia que tem à frente um dos maiores lutadores pelo Teatro em Portugal - Jorge Silva Melo.
E que prazer foi ter encontrado um sítio tão acolhedor, finalmente, para esta Companhia, o Teatro da Politécnica, mesmo ali onde era a cantina da antiga Faculdade de Ciências e onde tantas vezes comi...
O Teatro chama-se "Paulo Claro" em homenagem ao jovem actor da Companhia falecido em 2001 por acidente, tão novo.
E esta peça, uma das duas que a Companhia apresente neste momento (a outra é "A Morte de Danton", no D.Maria- Sala Garrett), chama-se "O Rapaz da Última fila", do dramaturgo Juan Mayorga e numa encenação colectiva.
A leitura de um (aparente) simples exercício de escrita sobre o fim de semana deixa Gérman (António Filipe), professor de Línguas e Literaturas, desiludido com a sua missão enquanto educador. Tentar orientar jovens de ensino secundário na arte da escrita parece um duelo de titãs. Composições desinteressantes, sem conexão, repetitivas… Até que surge a composição d’ O Rapaz da Última Fila.
Cláudio (Pedro Gabriel Marques) surpreende o seu professor ao trazer uma descrição rigorosa do seu fim de semana em casa do colega Rafael Marquez (Marc Xavier), cujas dificuldades em matemática servem de pretexto para que o protagonista consiga entrar na moradia daquela família de classe média e conseguir perceber o seu quotidiano. A primeira composição (e todas as restantes) recebem uma marca particular no final: (continua.)
À partida, o trabalho de Cláudio é como que reprovado pelas questões éticas e morais que levanta, já que se intromete na vida privada de um colega seu e a divulga. Juana (Maria João Falcão), mulher de Gérman, aconselha o professor a reprovar a atitude do jovem escritor, contudo o marido não quer desperdiçar a oportunidade de ajudar o rapaz que lhe parece ser a grande promessa da literatura.
Os textos seguem-se diariamente, os conselhos de melhoria e as sugestões de leitura também. Cláudio vai-se integrando na família e percebendo quais os seus pontos fracos e problemas, que relata de forma minuciosa.Gérman e Juana tornam-se leitores compulsivos e vão conhecendo também a família Marquez através das descrições que o recatado rapaz (pelo menos nas aulas) faz.
A posição da última fila, aquele sítio onde “ninguém nos vê, mas nós vemos toda a gente”, tomada por Cláudio alastra-se à moradia dos Marquez. Os estratagemas são muitos para conseguir tornar uma história desinteressante à partida num autêntico sucesso literário. O jovem escritor é também ele uma personagem que altera aquele que seria o percurso normal dos acontecimentos.

No mesmo cenário, cruzam-se espaços tão diferentes numa simbiose bem conseguida. Navegamos entre a sala do professor e da sua mulher, pela casa dos Marquez e pela sala de aula uma forma natural, embora os adereços nunca mudem de sítio. As várias histórias cruzam-se nas páginas do mesmo livro, construindo um todo perfeitamente consolidado.
As personagens são credíveis, cheias de valor humano e densidade. A isto se junta um bom humor proveniente dos próprios escritos de Cláudio que nos trazem uma descrição pura e dura da vida dos Marquez e que puxa pelo nosso lado mais voyeur.
A música do espetáculo é-nos dada pelo simples fluxo das palavras, num ritmo que nos prende do princípio ao fim. Também nós queremos saber o que vem a seguir ao tão misterioso “continua” de cada texto.
O próprio final nos surpreende. Cláudio é confrontado a encontrar ele mesmo um final para a sua história. O seu mestre ensina-o que o final deve ser cativante, surpreendente, inesperado. Como tal, a própria peça também nos traz um final que à partida não estaríamos à espera. Os esquemas complexificam-se e a ação toma um rumo inesperado.
A interpretação é bastante boa, com destaque para António Filipe e do jovem Pedro Gabriel Marques, muito seguro naquela que suponho será a sua estreia como actor.
O final não foge à regra de ouro de um bom final de um livro: inesperado, mas perante o qual, o leitor conclui que não poderia ser outro...
Simplesmente, e numa apreciação muito subjectiva, penso que, e propositadamente, o final é "escondido" pelo fecho das luzes, pois isso pode subentender um "beijo apagado".
Se alguém já viu a peça, que deixe a sua opinião, e quem ainda não viu, aconselho-a vivamente e depois também gostaria de ler o que pensam sobre ela e sobre o final.



Parte deste texto foi tirado do blog "Espalha Factos" e é da autoria de Wilson Ledo





sexta-feira, 23 de março de 2012

Seguindo em frente...



Aniversário

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a.olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho... )
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos ...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira! ...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...

Álvaro de Campos, in "Poemas"

quarta-feira, 21 de março de 2012

21 de Março

Eu sou por norma avesso aos dias mundiais disto ou daquilo, que quase preenchem todo o calendário, alguns deles com notórios fins consumistas, outros por mera idiotice.
Mas também há dias mundiais que respeito, porque têm para mim uma simbologia importante.
E entre estes, o dia 21 de Março é muito especial, pois nele se comemoram dois dias mundiais que me são particularmente sensíveis: o da Árvore e o da Poesia.
E além do mais é o dia do início da Primavera (este ano foi um dia antes, por ser um ano bissexto), a estação da renovação.
Assim, aqui deixo três referências - uma das mais belas árvores desta cidade de Lisboa, no Jardim do Príncipe Real
Uma poesia que quase obrigatoriamente teria de ser de Pessoa, neste caso de um dos seus heterónimos - Alberto Caeiro

"Hoje de manhã saí muito cedo

Hoje de manhã saí muito cedo,
Por ter acordado ainda mais cedo
E não ter nada que quisesse fazer...

Não sabia que caminho tomar
Mas o vento soprava forte, varria para um lado,
E segui o caminho para onde o vento me soprava nas costas.

Assim tem sido sempre a minha vida, e
Assim quero que possa ser sempre --
Vou onde o vento me leva e não me
Sinto pensar."

E finalmente o último andamento da maravilhosa obra de Stravinsky "A Sagração da Primavera" pela companhia de dança da grande Pina Bausch.

terça-feira, 20 de março de 2012

Tango acrobático

Geralmente, não aprecio por aí além, números circenses, mesmo que muito bem executados.
Abro aqui uma excepção, pois olho para esta apresentação como uma dança e não como um número de trapézio.
E depois há o tango... 
Se puderem ver em "full screen" será bem mais interessante.