quinta-feira, 31 de julho de 2008

Saber não ocupa lugar


O PIOR CEGO É O QUE NÃO QUER VER
Significado: Diz-se da pessoa que não quer ver o que está bem na sua frente. Nega-se a ver a verdade.
Histórico: Em 1647, em Nimes, na França, na universidade local, o doutor Vicent de Paul D'Argenrt fez o primeiro transplante de córnea num aldeão chamado Angel. Foi um sucesso da medicina da época, menos para Angel, que assim que passou a ver ficou horrorizado com o mundo que via. Disse que o mundo que ele imaginava era muito melhor. Pediu ao cirurgião que lhe arrancasse os olhos. O caso foi acabar no tribunal de Paris e no Vaticano. Angel ganhou a causa e entrou para a história como o cego que não quis ver.

ANDAR À TOA
Significado: Andar sem destino, despreocupado, passando o tempo.
Histórico: Toa é a corda com que uma embarcação reboca a outra. Um navio que está "à toa" é o que não tem leme nem rumo, indo para onde o navio que o reboca determinar. Uma mulher à toa, por exemplo, é aquela que é comandada pelos outros. Jorge Ferreira de Vasconcelos já escrevia, em 1619: - Cuidou de levar à toa sua dama.

ONDE JUDAS PERDEU AS BOTAS
Significado: Lugar longe, distante, inacessível.
Histórico: Como todos sabem, depois de trair Jesus e receber 30 dinheiros, Judas caiu em depressão e culpa, vindo a suicidar-se enforcando-se numa árvore. Acontece que ele se matou sem as botas. E os 30 dinheiros não foram encontrados com ele. Logo os soldados partiram em busca das botas de Judas, onde, provavelmente, estaria o dinheiro. A história é omissa daí para afrente. Nunca saberemos se acharam ou não as botas e o dinheiro. Mas a expressão atravessou vinte séculos.

QUEM NÃO TEM CÃO CAÇA COM GATO
Significado: Ou seja, se você não pode fazer algo de uma maneira, faz de outra.
Histórico: Na verdade, a expressão, com o passar dos anos, adulterou-se. Inicialmente dizia-se "quem não tem cão caça como gato", ou seja, esgueirando-se, astutamente, traiçoeiramente, como fazem os gatos.

PENSANDO NA MORTE DA BEZERRA
Significado: Estar distante, pensativo, alheio a tudo.
Histórico: Esta é bíblica. Como vocês sabem, o bezerro era adorado pelos hebreus quando se afastavam da sua religião e, noutras ocasiões, sacrificados a Deus num altar. Quando Absalão, por não ter mais bezerros, resolveu sacrificar uma bezerra, o seu filho menor, que tinha grande carinho pelo animal, opôs-se. Em vão. A bezerra foi oferecida aos céus e o garoto passou o resto da vida sentado do lado do altar "pensando na morte da bezerra". Consta que meses depois veio a falecer.

NÃO ENTENDER PATAVINA
Significado: Não saber nada sobre determinado assunto. Nada mesmo.
Histórico: Tito Lívio, natural de Patavium (hoje Pádua, na Itália), usava um latim horroroso, originário de sua região. Nem todos entendiam. Daí surgiu o Patavinismo, que originariamente significava não entender Tito Lívio, não entender patavina.

SEM EIRA NEM BEIRA
Significado: Pessoas sem bens, sem posses.
Histórico: Histórico: As casas do Brasil Colonial possuíam telhado formado por três linhas de telhas sobrepostas. Quando chovia, estes planos lançavam as águas para a rua e para o fundo do terreno. Abaixo do telhado, havia detalhes, chamados de eira, beira e entre beira, que serviam não só como adorno, mas também para distinguir as diferentes classes sociais dos proprietários. Quanto mais detalhes, mais rico o dono da casa. Assim, uma casa que não tivesse eira nem beira mostrava a condição humilde de seu dono!

VAI TOMAR BANHO
Significado: Quando alguém aborrece a nossa paciência, dizemos esta frase!
Histórico: Em "Casa Grande & Senzala", Gilberto Freire analisa os hábitos de higiene dos índios versus os do colonizador português. Depois das Cruzadas, como corolário dos contactos comerciais, o europeu contagiou-se com sífilis e com outras doenças transmissíveis e desenvolveu o medo ao banho e horror à nudez, o que muito agradou à Igreja. Ora, o índio não conhecia a sífilis e lavava-se da cabeça aos pés nos rios, além de usar folhas de árvore para limpar os bebés e lavar no rio as redes nas quais dormiam. Ora, o cheiro exalado pelo corpo dos portugueses, abafado em roupas que não eram trocadas com frequência e raramente lavadas, aliado à falta de banho, causava repugnância aos índios. Então os índios, quando estavam fartos de receber ordens dos portugueses, mandavam que fossem "tomar banho".

CALCANHAR DE AQUILES
Significado: O ponto fraco de uma pessoa.
Histórico: De acordo com a mitologia grega, Tétis, mãe de Aquiles, a fim de tornar o seu filho indestrutível, mergulhou-o num lago mágico, segurando-o pelo calcanhar. Na Guerra de Tróia, Aquiles foi atingido na única parte de seu corpo que não tinha protecção: o calcanhar.

CASA DA JOANA
Significado: Onde vale tudo, toda a gente pode entrar, mandar, prostíbulo e de lugares em que a bagunça, a farra e a promiscuidade predominavam.
Histórico: Essa frase teve origem no século 14, quando uma mulher abriu uma casa na qual se podia fazer de tudo. Essa mulher, obviamente, chamava-se Joana e era a condessa de Provença e rainha de Nápoles. Em 1347, aos 21 anos, Joana regulamentou os bordéis da cidade de Avignon, onde vivia refugiada. A jovem sempre teve uma vida cheia de confusões. Outra versão, esta brasileira, diz que na época do Brasil Império, mais especificamente durante a menoridade do Dom Pedro II, os homens que realmente mandavam no país costumavam encontrar-se num prostíbulo do Rio de Janeiro, cuja proprietária se chamava Joana. Como esses homens mandavam como queriam no país, ficou a frase .


CONTO DO VIGÁRIO
Significado: Sinónimo de falcatrua e malandragem.
Histórico: Duas igrejas de Ouro Preto receberam uma imagem de santa como presente. Para decidir qual das duas ficaria com a escultura, os vigários contariam com a ajuda de Deus, ou melhor, de um burro. O caso era o seguinte: colocaram o burro entre as duas paróquias e o animalzinho teria que caminhar até uma delas. A escolhida pelo quadrúpede ficaria com a santa. E foi isso que aconteceu, só que, mais tarde, descobriram que um dos vigários havia treinado o burro.


DOURAR A PÍLULA
Significado: Melhorar a aparência de algo.
Histórico: Antigamente as farmácias embrulhavam as pílulas em papel dourado, para melhorar o aspecto dos remédios amargos.

O CANTO DO CISNE
Significado: Representa as últimas realizações de alguém.
Histórico: Dizia-se que o cisne emitia um belíssimo canto pouco antes de morrer.

ESTÔMAGO DE AVESTRUZ
Significado: Quem come de tudo.
Histórico: O estômago do avestruz é dotado de um suco gástrico capaz de dissolver até metais.

LÁGRIMAS DE CROCODILO
Significado: É uma expressão usada para se referir ao choro fingido.
Histórico: O crocodilo, quando ingere um alimento, faz forte pressão contra o céu da boca, comprimindo as glândulas lacrimais. Assim, ele chora enquanto devora a vítima.

MEMÓRIA DE ELEFANTE
Significado: Diz-se que as pessoas que se recordam de tudo têm memória de elefante.
Histórico: O elefante lembra-se de tudo aquilo que aprende, por isso é uma das principais atracções do circo.

OLHOS DE LINCE
Significado: Ver longe.
Histórico: Esses bichos têm a visão apuradíssima. Os antigos acreditavam que o lince podia ver através das paredes.

CUSTAR OS OLHOS DA CARA
Significado: Serve para designar preços exagerados em qualquer relação comercial.
Histórico: Um costume bárbaro de tempos muito antigos deu início ao uso dessa expressão. Consistia em arrancar os olhos de governantes depostos, de prisioneiros de guerra e de pessoas que, por serem influentes, ameaçavam a estabilidade dos novos ocupantes do poder. Pagar alguma coisa com a perda da visão tornou-se sinónimo de custo excessivo, que ninguém poderia pagar. Um dos primeiros a registar o dito foi o escritor romano Plauto (254- 184 a .C.), numa das 130 peças de teatro que escreveu.

TIRAR O PAI DA FORCA
Significado: Ter pressa.
Histórico: Essa frase é atribuída ao facto de Santo António, estando em Pádua, ter que ir apressadamente até Lisboa para livrar o seu pai da forca, lenda muito conhecida que nos legou essa frase que tem tanta actualidade hoje em dia, onde quase toda a gente corre "como quem vai tirar o pai da forca".


SAIR À FRANCESA
Significado: Sair de uma festa ou cerimónia sem se despedir.
Histórico: Pode ter origem num costume francês ou na expressão "saída franca", indicando mercadorias sem impostos, que não precisam ser conferidas. Como os franceses primam justamente pela etiqueta, não concordaram com a frase e mudaram-na para "sair à inglesa". Alguns pesquisadores situam o aparecimento da expressão na época das invasões napoleónicas na Península Ibérica (1810-1812), mas o escritor Nicolau Tolentino de Almeida (1740-1811), cuja poesia satírica visava os usos e costumes de Lisboa, registou-a muito antes nestes versos: "Sairemos de improviso/ despedidos à francesa".

FICAR A VER NAVIOS
Significado: Ficar sem nada.
Histórico: Dom Sebastião, tinha morrido na batalha de Alcácer-Quibir, mas o seu corpo nunca foi encontrado. Por esse motivo, o povo português recusavase a acreditar na morte do monarca. Era comum as pessoas visitarem o Alto de Santa Catarina, em Lisboa, para esperar pelo rei. Como ele não voltou, o povo ficava a ver navios.




36 comentários:

  1. Caro Amigo "Pinguim"
    De facto o saber não ocupa lugar... E este post interessantíssimo é uma bela lição sobre muitas das nossas expressões idiomáticas cuja origem quase todos desconhecíamos.
    Se até o gorila está com vontade de conhecer mais sobre a espécie humana... como não apreciar devidamente este conjunto de conhecimentos tão bem "apanhados".
    Interessante, curioso, divertido e didáctico. Gostei imenso.

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  2. Tenho que agradecer à minha amiga Cristina, que me enviou um mail com isto; o que é curioso, é que o texto é originário do Brasil, pelo que fiz alguma selecção (eram mais uns 10...) e a respectiva adaptação ao portguês de cá (pois, o acordo, eu sei...)
    Abraço.

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  3. Alguns conhecia, mas a maioria não. Boa partilha!
    Abraço

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  4. Eu também desconhecia vários, amigo Sócrates; é sempre bom aprender e compartilhar...
    Abraço.

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  5. Muitas vezes ouvimos e dizemos todas estas expressões e não sabemos a sua origem, eu falo por mim... Obrigada...

    beijinhos

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  6. Isto lembra-me os regionalismos :P hehehe

    beijinhos

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  7. olá amigo, obrigado pelo contributo para a minha sabedoria ... nunca é demais...
    um abraço*

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  8. Amiga Carpe diem
    falas por ti e por muito mais gente, podes estar certa.
    Beijinhos.

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  9. Porquê, Martinha?
    Há por aí expressões locais com lendas por trás? Se há, vamos lá postar sobre isso...
    Beijinhos.

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  10. Amigo X_bear
    andamos todos a aprender uns com os outros; nem queiras saber o que eu já aprendi aqui na blogosfera...
    Abraço.

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  11. Não ocupa não senhor. É sempre bom aprender...
    Gostei.
    Abraço!

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  12. excelente, vou voltar cá, com calma, para ler o resto...

    bons pedaços de cultura

    abraço

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  13. Só uma pequena correcção amigo pinguim,se é que me permites.

    A expressão Sem Eira Nem Beira, é portuguesa, mais concretamente das Beiras (Alta e Baixa)que na altura das descobertas foi levada para o Brasil e outros locais.

    Abraço
    A.António

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  14. Gostei... e se houver mais, partilha!

    Só uma correcção, o Aquiles foi mergulhado no rio Styx... ao que me contaram, porque eu não estava lá para ver. ;)

    (en.wikipedia.org/wiki/Achilles)

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  15. Eu adoro estes fait-divers:)

    Como sou um interessado nestas pequenas curiosidades, isto vai adensar as minhas conversas convivas:)

    E agora para não sair à Francesa:)
    Abraço:)

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  16. Amigo Lampejo
    e eu ainda gostei mais de começar a ver regressar-te à blogosfera, a postar e a comentar; que longa hibernação...
    Abração.

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  17. Amigo Rocket
    tenho consciência de que é um post demasiado longo, mas já fiz algum rateio, acredita...
    Abraço.

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  18. Caro A.António
    como já disse, estas versões tiveram origem num mail vindo do Brasil, e assim, tratando-se de lendas, é normal, que num caso ou outro, tivesse havido uma transposição local para a explicação do sentido da expressão.
    Houve até expressões que vinham no mail, que eu não considerei, pois não são de todo, muito conhecidas no nosso território.
    De qualquer forma, um agradecimento pela tua explicação.
    Abraço.

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  19. Amigo Enginethrobs
    satisfeito pela tua visita; volto a frisar a origem destas explicações, e neste caso, embora fique rectificado o local do "mergulho" do pequeno Aquiles, o que interessa é saber a razão pela qual o calcanhar do dito não foi imerso.
    Abraço e volta sempre.

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  20. Olá amigo Hydra!
    De férias por cá ou ainda em trabalho na insularidade britânica?
    De qualquer modo é um prazer ver-te por aqui, mas preferia rir-me a valer com as tuas inconfundíveis histórias; eu sei que por cá há muito mais situações caricatas a merecerem a tua impagável ironia, mas por lá, também deve acontecer algo...
    Ainda bem que gostaste do post.
    Abraço amigo.

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  21. Bem, acabei as leituras em atraso por aqui com "a cereja no topo do bolo" - haverá explicação histórica para esta?
    Sim senhor, muito obrigado pela partilha, termino a semana um pouco mais culto na bagagem dos fait divers.
    Bom fim se semana (agora é que é) e um abraço

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  22. Curiosa a pergunta que fazes sobre a cereja no topo do bolo; quanto ao significado todos o conhecemos; já a sua origem...porquê a cereja?
    Bom fim de semana e abraço.

    Já conheci mais um blog que não te deve ser estranho..."O Bom ladrão", diz-te alguma coisa???, eh eh eh

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  23. Olá amigo. Passei por aqui para retribuir o abraço e não estava nada à espera de me deparar com toda esta informação em formato compacto :))
    Sim senhor, muito interessante!
    Encontrei aqui algumas explicações que não conhecia e que me vão dar um jeitão (risos)
    Desculpa esta ausência mas andamos cheios de trabalho nesta época do ano. Depois voltarei com mais calma. Felicidades para ti. Um grande beijinho

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  24. Obrigado Ana, pela tua visita, que é sempre um prazer, como o é. ler os teus textos.
    Beijinho.

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  25. Olá
    Regressei, passei apressadamente para da rum beijinho. Agora vou buscar o cão.
    bjocas

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  26. meu caro Pinguim parabéns por esta antologia de ditos populares bem enquadrada históricamente. Confesso que não conhecia a origem da maior parte deles.
    Um abraço.

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  27. o que a malta não aprende por aqui, hein! muito pedagógico, sim, senhor!

    abraço

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  28. Já regressada? mas que férias foram essas?
    Beijinhos e festinhas no cão.

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  29. Nem eu, amigo Paulo, tirando uma coisa ou outra; daí, a partilha.
    Abraço.

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  30. Meu bom Paulinho
    aqui na blogosfera, todos vamos aprendendo uns com os outros; se tu soubesses o que eu já aprendi desde que ando por aqui...
    Abração.

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  31. também eu, também eu me tenho fartado de aprender coisas. desta lista, por exemplo, das poucas expressões de que conhecia o significado era a do calcanhar de Aquiles porque vem da mitologia, de resto, nada. são muito bons estes momentos de partilha de saberes!

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  32. Caro Paulo
    e mesmo esse do calcanhar de Aquiles foi depois complementado com a indicação correcta do nome do rio, por um comentador...
    é a aprendizagem em corrente...
    Abraço.

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  33. Divertido e pedagógico, este teu post!
    Se todos achassem que o saber não ocupa lugar, melhor andaria o mundo...:))
    Abraço

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  34. De vez em quando recebem-se uns mails que um pouco retocados da sua origem brasileira, dão uns posts interessantes: foi o caso.
    De resto, aqui na blogosfera, vamos sempre aprendendo uns com os outros.
    Bom domingo.

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  35. Altamente educativo e muito bem exemplificado. Bravo!!!

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  36. Aprendemos uns com os outros, minha amiga; já aprendi coisas muito importantes contigo, sabias?
    Beijito.

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Evita ser anónimo, para poderes ser "alguém"!!!